Meu texto sobre Os Brasas, a maior banda de Jovem Guarda do Rio Grande do Sul, acaba de ser publicado no Overmundo.
Para aqueles que não curtem muito um link, segue abaixo o texto que está publicado lá. Se alguém quiser votar e fazê-lo entrar na home, agradeço. (Está na home e bem em cima, pra minha alegria).
Os Brasas, 1968
Ao ler os textos do Rodrigo Almeida sobre o disco do Caetano Veloso e o do Rogério Duprat, ambos de 1968, lembrei de um outro disco lançado no mesmo ano, que não teve o alcance desses dois, mas que também tem uma grande importância na música feita no Brasil na época: o único disco da banda gaúcha Os Brasas.
Maior nome da Jovem Guarda no Rio Grande do Sul, Os Brasas é uma banda bastante peculiar. Formada no começo dos anos 60 com o nome The Jetsons, se mudou pra São Paulo em 1966, onde gravou no ano seguinte o seu primeiro registro, um compacto simples com as músicas Vivo a Sofrer e Lutamos para Viver, já com o nome definitivo. Durante esse período, participaram do programa “O Bom”, no Canal 9, com apresentação do Eduardo Araújo, além de terem sido convidados a integrar a Banda Jovem do Maestro Peruzzi, uma aposta no talento dos rapazes. A formação contava com o Luis Vagner na guitarra e vocal, o Anyres Rodrigues na guitarra, o Franco Scornavacca no baixo e o Eddy na bateria.
Em 1968, saiu o único disco dos Brasas, pela gravadora Musicolor/Continental, inédito em CD até hoje. Tanto que só foi circular pelas gerações mais novas através de uma cópia em CD-R com esse registro e mais alguns compactos, por iniciativa de uma loja musical conhecida pelas raridades em Porto Alegre. O disco original tem as seguintes faixas:
1. A distância (Oriental Sadness) (Anyres - L. Ransford)
2. Beija-me agora (Fernando Adour - Márcio Greyck)
3. Um dia falaremos de amor (Tom Gomes - Renato de Oliveira - Luiz Vagner)
4. Quando o amor bater na porta (When love comes knockin' (at your door)) (Tom Gomes - Sedaka - C. King)
5. Meu eterno amor (Tom Gomes - Luis Vagner)
6. Que te faz sonhar, linda garota (What makes you dream, pretty girl?) (Anyres - M. Garson - J. Wilson)
7. Pancho Lopez (G. Bruns - T. Blackburt)
8. Ao partir, encontrei meu amor (No fuimos) (Osvaldo - Hugo)
9. Benzinho, não aperte (Tom Gomes - Luis Vagner)
10. Theme without a name (Clark - Davidson)
11. Não vá me deixar (Tom Gomes - Luiz Vagner)
12. Sou triste por te amar (Tom Gomes - Luiz Vagner)
O álbum abre com A distância, um cover dos Hollies, fato bem comum na Jovem Guarda, como comprovam trabalhos do Renato e seus Blue Caps, por exemplo. Mas é na segunda faixa, Beija-me agora, que começam os méritos da banda. Trata-se de uma balada com clima psicodélico, numa melodia poderosa e vozes muito bem colocadas. Um dia falaremos de amor é a típica música falada, que o Roberto Carlos eternizou em clássicos como Não quero ver você triste, com sons de violino e pianinho comandando. Quando o amor bater na porta, cover dos Monkees, ficou superior à original na minha opinião, tamanha a qualidade dos músicos. Meu eterno amor se destaca pelos vocais trabalhados com perfeição, resultando numa bonita balada. Que te faz sonhar, linda garota traz a guitarra característica do Luis Vagner, bem marcante durante toda a faixa.
Pancho Lopez, conhecida na voz do Trini Lopez, ganhou uma versão totalmente debochada, com direito a gritos em espanhol, dignos dos mais autênticos mexicanos. Ao partir, encontrei meu amor é uma faixa curiosa. Versão de uma música da banda uruguaia Los Shakers, foi gravada também pelo Renato e seus Blue Caps, porém com outro nome (Te adoro) e outra letra! Vale ouvir as duas pra comparar. Essa aqui tem uma ótima harmônica no começo, ao contrário do órgão que inicia a versão do Renato. Benzinho, não aperte é a típica música bonitinha de Jovem Guarda, com letra adolescente e bem humorada. Theme without a name é totalmente instrumental, coisas que os Brasas sabiam fazer com maestria. Não vá me deixar é uma psicodelia das boas, com uma guitarra que marcou época e influenciou muita gente. O álbum fecha com Sou triste por te amar, mais uma bela composição da dupla Tom Gomes e Luis Vagner, que aparece com cinco faixas no total.
O sucesso que poderia acontecer não chegou a se concretizar, pois no ano seguinte a banda acabou. O caminho mais curioso - e interessante - sem dúvida foi o do Luis Vagner, que mergulhou no reggae e se tornou um dos músicos mais respeitados no estilo, além de ter ajudado a moldar o samba-rock, ritmo tão em voga hoje em dia. Isso sem falar nas composições dele que grandes artistas da música brasileira gravaram. Por exemplo, a incensada Sílvia, 20 horas, domingo, gravada pelo Ronnie Von num dos seus discos psicodélicos e regravada pela banda gaúcha Video Hits em 2001, é de autoria dele. Que tal?
E mesmo assim, é estranho pensar que na época tinha gente que torcia o nariz pra eles. Ou nas palavras do meu pai, alguém que presenciou o surgimento dessas bandas nos anos 60, “Os Brasas eram meio mal vistos por muita gente. Bandas como o Som 4 – que tocava basicamente covers de Beatles - faziam mais sucesso entre o pessoal”. Explica-se: além de terem se formado num bairro de classe média baixa, (coisa que fazia diferença numa época de festas e shows em clubes tradicionais, por mais que hoje soe elitista e até descabido), eram uma banda local, e como se costuma fazer em lugares de caráter provinciano, o que vem de fora é sempre melhor. Ouvindo o som deles fica difícil conceber isso, mas acontecia. E talvez aconteça até hoje, mesmo que em outra escala.
Tenho certeza que pessoas de outros estados têm exemplos parecidos pra dar. Certo?