por Marcelo Firpo

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Santiago versus Papai Noel

Fui almoçar no shopping com o Santiago, mais precisamente no El Fuego, porque precisava encher um prato de comida, sentá-lo numa cadeirinha de bebê e fazê-lo comer de forma mais ou menos tranqüila. Praças de alimentação não costumam funcionar muito bem, porque ele se distrai e acaba não comendo nada. Como ele tinha me acordado às sete da manhã e às oito já estávamos na rua, andando de bicicleta, e como de praxe o único item consumido antes de sair tinha sido um Nescau de caixinha tetrapack, achei que não podia arriscar no almoço.

Enchi um prato combinando coisas pra mim e pra ele (polenta, ovos de codorna, mini-espigas de milho em conserva e ervilhas, acho que você entendeu, coisas divertidas), mais um peito inteiro de frango. Fui servindo, ele muito interessado nos ovos e na polenta, especialmente, mas comendo também um bom terço do frango e intercalando com ataques ao canudinho de suco "Santiago-pega-sozinho" de laranja.

Teve uma hora em que ele começou a recusar a comida e parecia mais interessado em brincar com as ervilhas. À minha argumentação de que ele deveria comê-las, Santiago rebatia com "não é pra comer boinha", que vem a ser precisamente a frase que eu uso em casa, quando ele brinca com alguma bolinha de plástico que tenha a mais remota chance de ser engolida e engasgada.

Depois que eu comi, paguei a conta e o garçom veio retirar os pratos, Santiago foi tomado por intensa indignação. Achei que tinha a ver com o fato das ervilhas divertidas terem ido embora, mas ele ficava repetindo "qué comê mais!" Meio incrédulo, pedi pra trazerem mais um bife, que ele comeu sozinho (mesmo que a todo o tempo eu ficasse fingindo que a garfada era pra mim, fazendo com que ele a roubasse. Poucas coisas são tão prazerosas para um filho pequeno quanto achar que está sacaneando seu pobre pai).

Finalmente saímos e, do vão da escada do segundo andar do shopping, percebi que o Papai Noel estava sentado em sua poltrona vermelha, à frente da árvore de Natal, no térreo. Disse para Santiago que estávamos descendo para ver o Papai-Noel-que-traz-presente, no que fui saudado por interesse e sorrisos. Pequeno parêntese: começo a ficar meio preocupado com a monomania dos presentes. Pela manhã, ao falar com a avó ao telefone, sua primeira pergunta,logo após o "Aô" foi "Tem pesente?".

Descemos pela escada rolante, nos aproximamos da poltrona e, assim que algumas crianças e pais saíram da frente, mostrei ao Santiago o Papai Noel em toda sua magnificência. Isto é, fiz uma honesta tentativa. Em meu colo, Santiago não apenas se esforçava para olhar para qualquer lado que não fosse o do Papai Noel, como também fingia não ouvir meus incentivos para que interagisse com o legendário velhote. Pra ser bem sincero, ele me lembrava um daqueles ímãs com polaridades afins, isto é, aqueles lados que eletromagneticamente se repelem a todo custo. Tentei virar me próprio corpo, isto é, eu ficar de costas para o Papai Noel para que Santiago ficasse de frente, mas ele se contorcia e dava um jeito de evitar qualquer contato visual com o sujeito. No rosto,uma expressão férrea do mais estudado desinteresse. Não parecia que ele não queria ver o Papai Noel; parecia que ele ainda não tinha se dado conta de que ele estava lá, ainda que isso fosse impossível, dada a minha argumentação e tentativas de colocar ambas as partes frente a frente.

Depois de um bom tempo, acabei desistindo. No caminho de volta para a escada rolante, tentei refletir sobre o assunto. Santiago estava acostumado a ver o Papai Noel nos DVDs do Elmo e também em algumas aparições no Discovery Channel. Para ele, o bom velhinho é uma criatura tão mitológica quanto o Barney ou os Backyardigans. Relacionando com um post do Galera sobre o assunto, pra ele o Papai Noel é fábula. Seu terror ao vê-lo ali, em carne, osso e tecido adiposo pode ser comparado ao terror de Barbie ao ver, em plena Mannhatan, o gigantesco cachorro Martin Tenbones, que povoava as suas fantasias infantis, só pra fazer uma citação hermética envolvendo "A Game of You", do Sandman. Quando fábula e realidade se chocam sem grandes preparações, é sempre meio assustador, mesmo. Era no que eu pensava, subindo a escada rolante, quando fui desperto pela frase do Santiago, finalmente liberto do seu transe:

"Eu tem medo do Papai Noel."

09/12/2006 19:24 | Comentários (9) | TrackBack (0)