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Não dá para imaginar Flaubert subindo na mesa e prendendo a atenção de vikings dizendo que ia falar sobre uma empregada velhinha chamada Felicité e sua fixação com um papagaio empalhado. Coisas interessantes, sim – isto é uma defesa das coisas interessantes na literatura. Pode parecer que ninguém é contra isso, mas na prática um monte de gente é. É chato ter que falar mal de um livro de Paul Auster. Talvez, como disse o Parada, Desvarios no Brooklyn dependa de um momento certo para ser lido e agradar. Mas, assim como já havia acontecido com A noite do oráculo, me pareceu apenas uma obra desinteressante. Mais ainda quando se trata do autor de Leviatã, Palácio da Lua e No país das últimas coisas, histórias cuja marca é a inventividade, em quase tudo diferentes deste Desvarios. É uma marca na produção de Paul Auster nos últimos anos essa opção pela "normalidade". Em vez do inusitado, do fim do mundo, de gente que voa ou sai explodindo estátuas da liberdade por aí, tramas sobre um caderno de capa azul que inspira um escritor com bloqueio criativo, um velho aposentado que se vê de volta ao Brooklyn tendo de lidar com a família, a poítica nos Estados Unidos. Personagens e temas que pouco têm a ver com as melhores obras que produziu. É uma tendência da atualidade, quase uma ditadura. Escapar disso pode levar o autor a ser chamado de pueril ou outras formas de rebaixamento. Julga-se não a obra, mas a temática. Ainda que Borges seja muito conhecido no Brasil e que Bulgakov, Krzyanowski e Flann O´Brien por cá tenham sido publicados, a influência destes é nula na literatura brasileira. Interessante, para a maioria dos autores e leitores, é tratar da vida íntima de personagens que poderíamos encontrar no supermercado ou na banca de jornal. O problema é que para saber da vida destes quase sempre basta uma conversa na fila no pão, não é preciso leitura. Desvarios é um livro elegante, que deixa a impressão de que Auster se preocupou em ser contemporâneo, em fazer uma crônica dos tempos atuais. Às vezes é populista (como na intragável citação a Sarajevo), às vezes abertamente político (a eleição fraudada de Bush também está lá) ou (argh!) lírico. Tudo muito bem feito, mas irremediavelmente banal. Não é que seja ruim. Só é decepcionante. # alexandre rodrigues | 20 de abril Comentários (3) | TrackBack (0) |
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