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Às vezes, como se fosse a idéia mais natural do mundo, Oberdã pensa que é um personagem de video-game. Na mesma tarde em que se convenceu de que não é real, pediu um chá com torradas e pôs os pés em cima da mesa de uma tradicional confeitaria do centro, onde os cavalheiros antigamente usavam rosas na lapela e alfinetes de gravata. E chapéus. E luvas. E no meio de toda a tradição, Oberdã cumpriu o ato com desavergonhado prazer. Se a confeitaria não existe, às favas com a etiqueta! Também beijou mulheres desconhecidas pela rua, deu um pontapé em um vira-latas e ofendeu criancinhas assustadas, puxadas pelo braço por mães e babás não menos apavoradas. Derrubou uma pilha de jornais na banca. Tentou furar a fila do ônibus. Na viagem lotada para casa, como se fosse uma revelação sem importância, berrou no meio de todos: “Eu sou ateu”. No entanto, ao chegar em casa já estava normal de novo. Oberdã mora com a mãe e a tia, que o vestiam de menina quando criança. Uma se chama Abigail; a outra, Melinda. Isso era quando se divertiam juntas, pois não se falam desde que Melinda fez uma operação para mudança de sexo e mudou o nome para Walter. Oberdã trocou de roupa, jantou em silêncio. Na hora do telejornal, foi para o quarto. De olhos fechados, jogado na cama, a realidade fugiu-lhe novamente e o jogo que começava agora dizia que ele era um futuro representante do povo. Como candidato do Partido das Pessoas que às vezes pensam ser Personagens de Vídeo-Game (PPPVG), Oberdã pede seu voto. Mas também garante: na realidade, a eleição não existe. * As últimas cinco fotos são do álbum de família de John Milisenda, por cuja existência sou grato. Aquela lá de baixo, do policial manjando a bunda do halterofilista, faz parte da série sobre Nova York de William Gedney. # alexandre rodrigues | 9 de setembro Comentários (0) | TrackBack (0) |
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