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"Eu estava sendo entrevistado pelo colega da Última Hora, pelo Pinheiro Júnior. O Pinheiro perguntou 'Qual seriam suas últimas palavras?' Essa piada quando um sujeito está com quarenta e um graus de febre foi de uma crueldade total. Eu disse como minhas últimas palavras só o seguinte: - Que boa besta é o Marx". Sensacional. Nelson Rodrigues passa um mês em coma, redescobre a eternidade da alma e depois da alta, lançando o livro O Reacionário, dá, em 1977, uma entrevista a Otto Lara Resende sobre a morte, envelhecer, Marx, Lenin, Napoleão, Cristo, o Idiota fundamental, a Grã-fina das narinas de cadáver, o complexo de vira-latas nacional, entre outros personagens e temas. Entrevista do tipo que quase nunca se vê. Entrevistador e entrevistado se provocam, discordam e discutem como só são capazes os velhos e os muito amigos. Otto faz o tipo espezinhador, que sabe que o outro tem paciência curta com contestações. Foram ambos muito amigos. Nelson batizou Bonitinha, mas ordinária com o subtítulo "ou Otto Lara Resende". Fez o personagem Edgar repetir diversas vezes "a frase do Otto: o mineiro só é solidário no câncer" – que o amigo na verdade não criou. Divergem principalmente sobre a juventude. Otto a valoriza. Nelson a despreza: "Aos 18 anos eu era de uma ignorância enciclopédica em matéria de amor e de tudo". Poderiam estar de camisa xadrez numa mesa de boteco no meio da tarde, com um copo de café com leite diante de cada um, discutindo a vida e os problemas do país, e o debate seria o mesmo. |
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