Massas honestas em São Chico
Existem dois tipos de restaurantes: os caseiros, que pretendem apenas servir uma comida boa e nutritiva aos clientes, e os gastronômicos, cujo objetivo principal é — ou deveria ser — inovar a culinária a que se propõe e oferecer a perfeição no preparo dos pratos. Ao se julgar a qualidade de um restaurante, é injustiça aplicar os critérios de um tipo ao outro, sob pena de considerar toda comida caseira ruim, ou toda haute cuisine obscenamente cara.
Foi com este espírito que tomei meu lugar na tratoria Pasta Nostra, em São Francisco de Paula, na Serra Gaúcha. Meu veredito: é honesto.
Muito já tinha ouvido falar sobre a casa de massas. A maioria dos elogios era algo como "dá para se encher de comida por uma ninharia". É a mais pura verdade. Com R$ 80, cinco pessoas comeram bem e ainda sobrou nos pratos. Pedimos entrada, cinco tipos de massa, um bife na chapa, sobremesas, vinho, suco e cafezinhos.
O que mais chamou a atenção no restaurante foi o silêncio. É raro encontrar uma casa em que não se tenha de gritar para os colegas de mesa. No Pasta Nostra, todo mundo falava em um tom razoável. A casa onde fica é também tipicamente colonial, com decoração condizente, inclusive com direito a alguns enfeites um pouco bregas, como toda boa casa de colonos.
A entrada foi uma cestinha de pastéis. Os sabores são queijo, carne e galinha. Detesto frango, mas gostei mais dos últimos, porque eram os mais temperados. Ao de queijo e ao de carne faltava um pouco de personalidade. O de carne, sobretudo, se beneficiaria muito de azeitonas. Mas os pastéis eram sequinhos e chegaram à mesa bem quentes.
No Pasta Nostra, o cliente escolhe primeiro o tipo de massa, depois o molho. O preço do prato resulta da adição do preço da massa escolhida com o do molho. Pedi tortéi aos quatro queijos. Meus colegas ficaram com talharim à carbonara, à pasta nostra — com vinho branco, tomate, cebola, nata e presunto — e tortéi à pasta nostra. O tortéi deles é muito bom, porque, ao contrário de muitas outras tratorias, não é doce em excesso. O talharim caseiro também é ótimo e veio al dente.
O molho aos quatro queijos não tinha quatro queijos, ou ao menos eles não aparecem. Quatro queijos sem gorgonzola, aliás, não presta. O molho à pasta nostra tem um sabor bastante clássico, em que o vinho se sobressai. O melhor em minha opinião é o carbonara, muito embora seja feito com o que parece nata ou molho branco, em vez de gemas de ovo, como na receita original. Já o bife estava no ponto certo e era grande, mas ficou com um pouco de gosto de óleo da chapa.
O vinho é de garrafão, então nem merece comentários. Pedi suco de laranja, porque estava na maior ressaca. Fiquei satisfeito ao escutar o ruído do espremedor vindo da cozinha. Mesmo sem açúcar, estava bem doce. Quanto à sobremesa, o sorvete aparentemente estava velho. Parece que pouca gente pede.
Apesar destes pequenos defeitos, o Pasta Nostra está bem acima da média das tratorias gaúchas. É tão boa ou melhor que a Spina, na Cidade Baixa. Daria três garfinhos como nota.
Marcelo Träsel | 14.05.2006, 16:00 | Comentários (3) | TrackBack (0)