As melhores refeições da minha vida
Estava havia quatro meses viajando de mochila pela Europa, pelo menos trinta dias pelo Leste. Chegara a Cracóvia vindo da Eslováquia, onde ninguém falava inglês. Ao descer do trem, fui abordado por dezenas de representantes de albergues, todos estudantes. Negociei um pouco e fui levado para um albergue grande e relativamente confortável, onde encontrei um brasileiro. Rafael era de São José dos Campos e tinha feito um estágio em engenharia em Montenegro, em uma empresa onde só se falava o que quer que eles falem por lá.
Acabamos perambulando pela cidade juntos. O detalhe engraçado é que o Papa João Paulo II estava por visitar sua Cracóvia natal em poucos dias, o que levou o governo a proibir a venda de álcool em toda região. O desespero entre os mochileiros obrigados a se manter sóbrios foi lindo de se ver. Enfim, Rafael gostava de comer e foi parceiro de conhecer um dos melhores restaurantes poloneses, segundo o guia Lonely Planet. O nome é Chlopskie Jadlo, ou "comida camponesa".
Camponesa era mesmo. Estava havia semanas sem uma refeição que prestasse, porque é difícil convencer mochileiros a freqüentar restaurantes bons e comer sozinho é deprimente. No Chlopskie, fomos apresentados ao pão com banha. Era um pão bem colonial, em fatias grossas. A banha vinha em uma caneca esmaltada, com pedacinhos de torresmo e salsinha. Prove um dia, é surpreendente. Pedimos também schabowy po chlopsku, filé de porco empanado com batatas, nata e repolho refogado, servido em uma tábua de cortar. Além disso, kaszanka, feito com o recheio de uma morcilha jogado em na frigideira e refogado com cebola.
Essa refeição provou que a comida simples pode ter um sabor muito sofisticado. Na verdade, como qualquer bom cozinheiro sabe, o simples é sempre mais difícil de acertar do que o barroco, em que uma profusão de temperos e texturas esconde erros pequenos. Num prato simples, não se pode errar. E o pessoal do Chlopskie Jadlo não erra.