PENDURA A CHUTEIRA, GABRIEL
É muito triste ver os livros que ocupam os primeiros lugares entre os mais vendidos no Brasil. Completando dois meses e uma semana no ranking, em primeiro lugar está Memórias de minhas Putas Tristes, de Gabriel García Marquez. Seria um livro de estréia razoável para um jovem escritor. Mas a narrativa curta, de pouco mais de cem páginas, dificilmente combinaria com o vigor natural a um estreante. Em seu vulto de Prêmio Nobel, Marquez não condiz com a sonolência e a banalidade que apresenta. Apesar da palavra chula no título, a novela é limpa, sem exageros barrocos e nem realismos mágicos. É simples. E nisto começa e termina seu mérito.
O mote sugeriria uma devassa sucessão de relatos hedonistas, com um toque de melancolia nostálgica. Na verdade, o clima é de uma tarde ouvindo as histórias de um vovô cansado, um pouco capengas pela falta de energia em contá-las. A promessa de devassidão feita pelas primeiras linhas não se cumpre. A noite de amor de um velho de 90 anos com uma adolescente de 14 jamais se concretiza. O que não é de admirar, pelo contrário: com a desculpa de provocar um estranhamento pela frustração, comprova o óbvio: anciãos não desvirginam jovenzinhas. Quando muito, acariciam seus cabelos e contemplam sua nudez, inertes e apaixonados. Portanto, a ficção não abandona nunca a estaca zero. Não evolui. E se arrasta em poucos capítulos que terminam sempre na repetitiva volta ao princípio. Parece ter sido escrita para cumprir contrato, tamanha a burocracia e gratuidade.
O fato de estar em primeiro lugar entre os mais vendidos prova o mau gosto do consumidor de livros no Brasil e a vulgaridade de quem tem o poder aquisitivo para consumir literatura. Impressionado pela assinatura na capa e talvez pelo preço relativamente pequeno (algo como R$ 24,90), leva para casa ou dá de presente um volume que só vale pela marca. Perfeito princípio da Havaianas da Adidas aplicado às prateleiras.
10/09/2005 17:07 | Comentários (0) | TrackBack (0)