NOTAS GAUDÉRIAS
Almoço no Ocidente e depois uma caminhada no brique ao sol da Redenção: Porto Alegre vivida em seu melhor estereótipo. Encontrar alguém por acaso logo depois de fazer um comentário sobre essa pessoa: Porto Alegre no seu pior estereótipo.
Fui ver meu tio, o que foi operado de câncer. Incrível como as pessoas ficam mais lúcidas, sérias e (me faltam adjetivos) quando passam por estas experiências de morte iminente. Nunca estive tão próximo daquele homem, ele falava como se cada frase fosse a última. E estava surpreendentemente bem para um paciente de câncer com parte do pulmão extraído. Me deu exemplo e um intensivão de caráter como nunca havia tido nem de meu pai, que sempre foi muito calado quando os assuntos são mais sérios. Talvez pressentindo que aquela poderia ser nossa última tarde, nosso último café, meu tio imprimiu valores e atitudes que são novos, não os tinha ainda na formação. Eu também estava prestando muita atenção, porque sabia que pode ser a última vez. E a força deste encontro vai sempre me acompanhar, mesmo que não seja, de fato, o último, como torço para que não seja.
“Tu podes descer alguns degraus, passar necessidade, mas vais estar com tuas próprias pernas, com tua força.Tua crença em ti mesmo vai mudar e tu serás um vencedor a partir daquele momento e sempre.”
De repente ficou muito mais importante ter o respeito e admiração das pessoas do que ter sua afeição condescendente e ser engraçado.
Abandonei o Bom Fim logo depois, caminhando. Achei que seria um deprimente encontro entre um jovem sobrinho saudável e seu tio moribundo, mas a sensação que eu tinha era a de operar uma mudança séria no rumo dos fatos que compõem minha história. É uma boa sensação. Precisa-se de rigidez nas idéias. Inflexibilidade. Força, força, fora. Vontade. Paciência, perseverança. As palavras de ordem se amontoavam. O sol e o ar seco sedimentavam a sensação.
Cada gaúcho tem um ditadorzinho dentro de si. O meu gosta de prender e torturar quem acha que a Varig devia falir de uma vez e que todos os funcionários e ex-funcionários devem procurar outras atividades. Pela lógica do Deus Mercado. O meu ditadorzinho tem uma lógica: COMO falar mal de uma empresa que foi a própria utopia do socialismo encarnada? Que foi um padrão, um sonho, quase oitenta anos de serviços bem prestados? A Varig, para o meu ditadorzinho, é um patrimônio cultural não apenas do povo gaúcho mas de todo o Brasil. As pessoas tem um carinho especial, preferem inclusive, a Varig. Podendo escolher outras mais baratas, querem Varig. E meu ditadorzinho fica muito louco quando ouve que a Varig é sustentada pelo Governo. O Governo não sustenta ninguém, é o próprio e enorme parasita de tudo. Se alguém acha que a Varig é um problema, por favor, não me diga. Pode perder um amigo.
Os ditadorzinhos gaúchos ficam por aí, gnomos de opinião, pulando com suas perninhas curtas aos berros de “somos mais politizados, somos mais politizados”. Eles são tão engraçadinhos.
Estranhei que as pessoas dão uma boa olhada em ti quando tu te aproxima. Meio de canto, às vezes sem o menor pudor. Ontem tive a impressão de que descobri o motivo: todo mundo acha que por trás de um vulto desconhecido há um criminoso em potencial. A insegurança é grande na mui leal e valorosa. Em outro blog um anônimo falou que eu considerava o Rio Grande do Sul uma Suíça. Isso só é verdade no que se refere às boas carnes e laticínios.
Fazer um churrasco em casa comprando coisas no Zaffari: algo que quase me faz mudar de idéia e voltar. A carne perde todo o sentido de outra forma que não esta.
Postar, pra mim, tem uma função organizacional. Colocar as coisas de forma clara, exercitar a consciência. Nunca esperem aqui pirotecnias e truques de marketing.
Esta tranqüilidade aconchegante da residência do Carlos fará muita falta.
26/09/2005 11:58 | Comentários (2) | TrackBack (0)