A HORA DE PARAR
Não vi a cara que fiz quando soube que Zélia Duncan tinha se juntado aos Mutantes em mais um revival caça-níquel. Cheguei até a cogitar a hipótese de ir no show gratuito que fizeram no aniversário da cidade, mas aleguei mentalmente que não valeria o esforço. Não pude, entretanto, deixar de assistir com interesse a participação deles no Jornal da MTV de ontem. Não por acaso, uma das pautas era: o rock dos anos 60 é melhor ou pior que o atual?
Pra mim não resta a menor dúvida de que o rock dos anos 60 foi superior. Nos anos 60. Qualquer tentativa de repetir os efeitos do momento histórico é o que se vê nestes revivals: cansaço, velhice, vexame. Piora muito quando artistas ''atuais'' são chamados para tapar buracos que o rancor ou a morte impediram que fossem tapados. Zélia Duncan entrou como Rita Lee. Confere a masculinidade que Arnaldo Batista deixou cair com alguma rosca queimada numa padoca nos anos 70. Ambos parecem ser músicos convidados fazendo backing vocals. O Arnaldo tá um caco: olhos de japonês que se esbugalham vez que outra nas interpretações teatralmente afetadas de cada verso. O Sergio Dias ainda mostra genialidade no uso do seu instrumento e até nos vocais. Nunca deixou a peteca cair, aparentemente.
De uma forma geral, apesar de serem as impressões de uma partcipação ao vivo em TV, só me deu tristeza e irritação ver o revival d'Os Mutantes. Parece até um cover da banda que foi nos anos 60, como acontece com qualquer um desses tios que tentam faturar em cima da nostalgia e da renovação nula que o rock atual apresenta. Ray Manzarek traiu a memória de sua banda chamando o fulaninho do The Cult pra fazer a turnê mundial de Doors em 2004. Antes dele, John Lydon constrangeu o mundo com a turnê Filthy Lucre dos Vovôs Pistols sem nem precisar repor ninguém. Até o A-Ha voltou tempos atrás. Os Rolling Stones fazem um revival de si próprios há 20 anos. Os Ramones não souberam a hora de parar, mas pelo menos a morte dos líderes nos poupa de qualquer tentativa de volta. Brian Wilson me deixou muito triste ao lançar, em 2004, um Smile tremendamente inferior ao original que nunca saiu e cheio de músicos de apoio, também saindo em turnê mundial, praticamente de muletas. Garanto que muitos dos que me lêem em Porto Alegre estão pensando com carinho em ir ver o Axl Rose com outros quatro agonizar em público no Gigantinho em maio.
Todas estas tentativas de volta mostram o poder da nostalgia e da grana (que faz e destrói coisas belas). É muito difícil saber a hora de parar, principalmente porque o olho é grande e ainda cresce mais por tendência. Mas pô, olhem o Romário. Ele não precisa, mas continua. Por um único motivo: seu senso do ridículo mostra que ainda dá um banho nos jovens, pelo menos na objetividade futebolística, que se baseia em TENTOS, não na energia de cada drible. A música ainda depende de algumas coisas que só a tenra juventude pode proporcionar. Os tios que tentam perpetuar esta energia do rock só são dignos de piedade. Menos o Serginho Batista. Este pode estar beiçudo, mas ainda é mestre.
08/03/2007 16:09 | Comentários (4)