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outubro 6, 2007

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O futebol anda numa fase tão pastel de rodoviária que às vezes me pergunto qual é a motivação que os torcedores ainda encontram para se emocionar. Uma das coisas que há tempos deteriora o sentimento é a ausência dos ídolos, dos heróis, que vão para a Europa ainda naquela fase do "manhê, vem limpá". Mesmo os melhores jogadores que os clubes criam não chegam a ocupar o posto de ídolo da massa. Quando muito, transformam-se em fenômenos de marketing. Mas há raríssimas exceções, e creio que são elas as responsáveis pelo não esmorecimento total da emoção.

Na sexta-feira da outra semana, no começo da noite, fui a um mercado comprar o que se precisa nestes dias: latas de cerveja e um pacote de Doritos. Estava no caixa, pagando minhas preciosas compras, que somavam 10,75. A atendende pergundou se eu tinha 75 centavos e estendi a mão para mostrar que não tinha. Ela perguntou se uma daquelas moedas miúdas não era de 25. Já meio incomodado, respondi que: "se eu disse que não tenho é porque não deve ser, né, moça?". Atendentes de mercados, fica a lição: nunca contrariem um homem comprando cerveja numa noite de sexta.

Bem, as coisas já estavam na sacola, eu aguardava a nota, quando minha visão periférica denunciou que alguém entrava no mercado. Olhei de relance, olhei para a sacola e imediatamente voltei minhas atenções para o cara que se aproximava, reconhecendo-o de imediato. Senti um calafrio. Abandonei o caixa e meio sem jeito o abordei, largando uma pergunta retórica que tinha a missão apenas de parar a marcha do cidadão.

- Fabiano?

- Oi, cara. Tudo bem?

Em todos os dias de treino que fui ao Beira-Rio, como jornalista ou a passeio, nunca costumei me espantar com o fato de falar com jogadores, mesmo os de grande nome. Geralmente penso apenas que ali está um profissional muito bem pago para representar o Inter e que se ele assim não o fizer terá que acertar as contas com a torcida. Não sou deslumbrado com este tipo de coisa, talvez porque isto esteja acontecendo no presente, que tem menos impacto do que as épocas passadas. Talvez daqui a uns 10 anos eu pense que entrevistei o Alexandre Pato, fenômeno, e então ache isto sensacional. Vai saber.

Mas ali estava eu, paralisado como um guri de 10 anos estaria diante de um ídolo intocável. Como um católico deve se sentir ao encontrar uma autoridade religiosa. De imediato imaginei-o vestindo uma camisa vermelha, que certamente tinha o mítico 7 às costas. Ali estava o homem que venceu jogos que valeram como títulos. O último grande ponteiro do futebol gaúcho, talvez do Brasil. O cara que mesmo gordo, decadente, machucado e fora de forma, anos depois de seu auge ainda fazia o Grêmio temer.

Pensei em dizer que era grato por tudo que ele fez, por ter me dado alguns dos dias mais emocionantes da vida. Mas exatamente o quê? Que imagem poderia representar isto tudo? Poderia ser a sensacional virada contra o Flamengo em 1996, no Maracanã. Ou o Gre-Nal da final do Gauchão de 1997, quando, agarrado ao arame farpado, explodi de euforia num Beira-Rio lotado num julho de renguear cusco. Poderia ser o inesquecível clássico dos 5 a 2, um dos maiores jogos do Inter de todos os tempos.

Mas não foi nada disto. O que me veio à cabeça foi simplesmente Fabiano sendo lançado na ponta-direita de um jogo qualquer e partindo como um tanque para cima do adversário apavorado, enquanto a geral do Beira-Rio toda se levantava e produzia um urro abafado. E por isto me senti grato. Por inúmeras vezes Fabiano partir pela ponta do gramado do Beira-Rio, em movimentos brutos e rápidos que pareciam querer dizer apenas que é bonito de se ver futebol, que nós estávamos juntos amassando todo mundo no tapete verde do Gigante. Tive vontade de agradecer por ter me levantado da geral inúmeras vezes para ver a camisa 7 em disparada derrubando constelações de zagueiros. Perdido, sabendo que era um grande momento, mas não querendo tornar a situação contrangedora, dei andamento ao curtíssimo diálogo.

- Ahn...bom te ver por aí.

- Valeu, cara. Obrigado.

Trocamos um breve aperto de mão e cada um seguiu seu caminho neste mundo de zagueiros e enormes faixas de gramados a serem exploradas.

Saudações,
Douglas Ceconello.


Publicado em outubro 6, 2007 4:30 PM

Comentários

sensacional.

Publicado por: guilherme lemos em outubro 6, 2007 5:03 PM

Catchaça

Publicado por: bruno em outubro 6, 2007 5:05 PM

Graças a Deus que tem um Douglas para salvar a imprensa esportiva.

Eu corri para o Impedimento depois de ler ISSO:

http://globoesporte.globo.com/ESP/Noticia/Futebol/Flamengo/0,,MUL145668-4282,00.html

Publicado por: Luís Felipe em outubro 6, 2007 8:23 PM

Douglas, faço questão de ler seu blog todo dia. Muito bom, véi. Mas, enfim, não tenho ídolos. Até poderia ter se o AMÉRICA não tivesse vendido GILBERTO SILVA (Arsenal), FRED (Lyon) e WAGNER (Cruzeiro). Sou COELHO, mas não consigo ter ídolos.

Publicado por: Diogo Silveira - BH - em outubro 6, 2007 9:44 PM

Porque um centroavante como o Tuta merece estar vestindo a camisa 9 do Grêmio? Santo Cristo, o homem esta afundando os gramados por onde passa de tão desleixado que é, assim reflete o seu futebol. Começa já pela camisa de fora, as meias meio cano (jogador que usa desse jeito, ou é muito craque [Renato P.] ou é muito preguiçoso.) Nunca tá lance, sempre fora. Não consegue mata uma bola no peito sem perder em seguida. E eu que acha ruim os tempos de Zé Alcindo e Afonsão.

Publicado por: Socorro roubaram os OLHOS do Mano. em outubro 6, 2007 9:44 PM

Obrigado Douglas.

Publicado por: Paul em outubro 7, 2007 12:37 AM

Sabe, Suellen, você é exatamente o tipo de pessoa que ainda me faz acreditar em futebol, que a gente ainda vai ter alguém pra encontrar e se deslumbrar e essas coisas. Texto sensacional.

Publicado por: Lila em outubro 7, 2007 12:45 AM

vale quanto q o fabiano saiu com um 6 pack de brahma do supermercado para casa?

Publicado por: Anonymous em outubro 7, 2007 2:04 AM

De que serve viver tantos anos sem amor
Se viver é juntar desenganos de amor
Se eu morresse amanhã de manhã
Não faria falta a ninguém
Eu seria um enterro qualquer
Sem saudade, sem luto também
Ninguém telefona, ninguém
Ninguém me procura, ninguém
Eu grito e um eco responde: "ninguém! ninguém"
Se eu morresse amanhã de manhã
Minha falta ninguém sentiria
Do que eu fui, do que eu fiz
Ninguem se lembraria

Publicado por: Antônio Maria em outubro 7, 2007 2:46 PM

ENTENDO exatamente o que se passou contigo: esses sujeitos evocam flashes de momentos dionisiacos que fazem a vida de um amante do futebol mais iluminada. Senti RAIVA dessa pinta no dia dos 5x2 (eu estava no Olimpico...) mas hoje, passada a rusga, o admiro: um idolo LEGITIMO do co-irmao que deve ser respeitado.

Vide (que orgulho!) o dia em que eu encontrei A FERA (DIVAN, Gabriel. "Ele estava no meio de nos". Impedimento: 2007, Jan/Fev) :)

Publicado por: Gabriel Divan em outubro 7, 2007 4:11 PM

Muito bem...

Publicado por: Rudi em outubro 7, 2007 9:52 PM

Douglas, digo mais: perdi praticamente TODO o tesão de berrar, torcer, chorar (ou seja, me emocionar) quando entrei pro CD do clube e comecei a acompanhar como eram feitas as reuniões e tomadas as decisões.

Acredito que isso (a politicalha) também colabora para esse estado de decepção com o futebol.

Publicado por: Jeferson Thomas em outubro 8, 2007 7:06 AM

Melhor post da historia. E olha que sou gremista...

Publicado por: Rodolfo em outubro 8, 2007 9:12 AM

Uuuuuuuuuuuuuuuuuuhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Fabiano!!!!

Valeu Douglas muito bom!

Publicado por: Alisson Coelho em outubro 8, 2007 10:38 AM

Uuuuuuuuuuuuuuuuuuhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Fabiano!!!!

Valeu Douglas muito bom!

Publicado por: Alisson Coelho em outubro 8, 2007 10:39 AM

Valeu, gurizada. Que nunca morra este encanto.

Publicado por: Douglas Ceconello em outubro 8, 2007 11:00 AM

Texto Fantástico!!

Uh Fabiano! Uh Fabiano!

Publicado por: Christian em outubro 8, 2007 11:48 AM

Bah, muito bom!

Cara, um detalhe legal é que os comentários da galera aqui são sobre futebol. Tem colorado, gremista, galera de minas e todo mundo na boa. Sem aquela xingação desagradável.
Show de bola!

Publicado por: Sapuka 1a divisão em outubro 8, 2007 11:59 AM

Poucas vezes fui às lágrimas no estádio. O Fabiano foi responsável pela maioria.

Publicado por: Vinicius em outubro 8, 2007 12:48 PM

Excelente, Douglas. Excelente.

Publicado por: Giordano em outubro 8, 2007 4:16 PM

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