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Fazer sociologia barata com o boletim de ocorrência dos outros é refresco, então nada melhor do que um assalto básico para ver até que ponto vão minhas convicções a respeito de como se deve proceder com o problema do crime.
Pois bem: desço do carro de minha mãe para deixar um envelope num prédio, no bairro Auxiliadora. Estou falando ao celular. Quando chego do outro lado da rua, vejo com o canto do olho dois homens se aproximando do veículo. Nesse momento, minha mãe começa a gritar e fico meio abobalhado. Quando consigo me recompor e faço menção de ver o que está acontecendo, um sujeito de boné vermelho me aponta uma arma prateada por cima do carro. A única coisa em que consigo pensar é "como posso impedir esses caras de levarem minha mãe?". Felizmente, não estavam interessados nela. Arrancaram e se mandaram com uma bolsa cheia de documentos e duas ou três sacolas de roupa suja — inclusive algumas camisetas compradas em viagens, das quais sentirei muita falta. Ninguém se machucou, ao menos.
Telefonamos para o 190 e uma viatura da Brigada Militar [vazando litros de óleo do motor] chegou em 15 minutos. Foram atenciosos, mas não deram falsas esperanças. Um dos policiais informou que, dali, a rota mais óbvia seria descer a Terceira Perimetral, pegar a BR e ir para Esteio ou Sapucaia. Disse que em geral eles põem um carro para vigiar a rótula que leva ao aeroporto. Perguntamos se tinham feito isso e ele riu meio sem jeito, contando que a única viatura disponível para isso era aquela em que ele chegou até o local do crime.
Folgo em declarar que minhas convicções seguem intactas. Nenhum sentimento de vingança contra os bandidos. Não sou imbecil, obviamente, e tenho certeza de que eles são lixo humano, mas não consigo achar que são o problema principal. O problema não é dois malandros apontarem uma arma para minha mãe e levarem o carro dela. Não, o problema de verdade é esses e outros malandros ficarem soltos, porque o Estado é inoperante. E o Estado é inoperante porque o brasileiro tem pouca fibra moral, como se dizia antigamente. Ainda por cima, acha que os governantes que deixam as coisas chegarem a esse estado brotaram nos cargos por geração espontânea, a falta de participação política e ignorância grassante não têm nada com isso.
Lidar com o crime com sede de vingança é piorar a situação. A bandidagem só age livremente por culpa do Estado — aliás, falta dele — e da mania de achar que o governo são os governantes, e não o povo que os elegeu. Não há diminuição da maioridade penal e protesto de branco que dêem jeito nisso. Só queimando Brasília, mesmo.
Bem... Certo, certo, eu não tenho tanto sangue de barata assim. Toda vez que algo do gênero acontece comigo ou perto de mim, penso em uma solução mágica para o problema social da violência, não muito melhor do que jurar vingança contra todos os pretos e pobres ou fazer manifestações inúteis: emigrar. Ir morar em Berlim, onde se pode andar na rua a qualquer hora do dia ou da noite sem medo de ser assaltado. E onde mandatários que deixassem as coisas chegarem a esse ponto estariam sendo enforcados em praça pública.
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