Comentários sarcásticos, crítica vitriólica e jornalismo a golpes de martelo por Marcelo Träsel


faroeste

Fazer sociologia barata com o boletim de ocorrência dos outros é refresco, então nada melhor do que um assalto básico para ver até que ponto vão minhas convicções a respeito de como se deve proceder com o problema do crime.

Pois bem: desço do carro de minha mãe para deixar um envelope num prédio, no bairro Auxiliadora. Estou falando ao celular. Quando chego do outro lado da rua, vejo com o canto do olho dois homens se aproximando do veículo. Nesse momento, minha mãe começa a gritar e fico meio abobalhado. Quando consigo me recompor e faço menção de ver o que está acontecendo, um sujeito de boné vermelho me aponta uma arma prateada por cima do carro. A única coisa em que consigo pensar é "como posso impedir esses caras de levarem minha mãe?". Felizmente, não estavam interessados nela. Arrancaram e se mandaram com uma bolsa cheia de documentos e duas ou três sacolas de roupa suja — inclusive algumas camisetas compradas em viagens, das quais sentirei muita falta. Ninguém se machucou, ao menos.

Telefonamos para o 190 e uma viatura da Brigada Militar [vazando litros de óleo do motor] chegou em 15 minutos. Foram atenciosos, mas não deram falsas esperanças. Um dos policiais informou que, dali, a rota mais óbvia seria descer a Terceira Perimetral, pegar a BR e ir para Esteio ou Sapucaia. Disse que em geral eles põem um carro para vigiar a rótula que leva ao aeroporto. Perguntamos se tinham feito isso e ele riu meio sem jeito, contando que a única viatura disponível para isso era aquela em que ele chegou até o local do crime.

Folgo em declarar que minhas convicções seguem intactas. Nenhum sentimento de vingança contra os bandidos. Não sou imbecil, obviamente, e tenho certeza de que eles são lixo humano, mas não consigo achar que são o problema principal. O problema não é dois malandros apontarem uma arma para minha mãe e levarem o carro dela. Não, o problema de verdade é esses e outros malandros ficarem soltos, porque o Estado é inoperante. E o Estado é inoperante porque o brasileiro tem pouca fibra moral, como se dizia antigamente. Ainda por cima, acha que os governantes que deixam as coisas chegarem a esse estado brotaram nos cargos por geração espontânea, a falta de participação política e ignorância grassante não têm nada com isso.

Lidar com o crime com sede de vingança é piorar a situação. A bandidagem só age livremente por culpa do Estado — aliás, falta dele — e da mania de achar que o governo são os governantes, e não o povo que os elegeu. Não há diminuição da maioridade penal e protesto de branco que dêem jeito nisso. Só queimando Brasília, mesmo.

Bem... Certo, certo, eu não tenho tanto sangue de barata assim. Toda vez que algo do gênero acontece comigo ou perto de mim, penso em uma solução mágica para o problema social da violência, não muito melhor do que jurar vingança contra todos os pretos e pobres ou fazer manifestações inúteis: emigrar. Ir morar em Berlim, onde se pode andar na rua a qualquer hora do dia ou da noite sem medo de ser assaltado. E onde mandatários que deixassem as coisas chegarem a esse ponto estariam sendo enforcados em praça pública.

26 de fevereiro de 2007, 1:01 | Comentários (43)

azeredo chega ao primeiro mundo

Ou foi o primeiro mundo que virou república bananeira? Lamar Smith, um senador republicano do Texas, propôs uma lei parecida com a do nosso senador tucano, exigindo que os provedores de acesso à Internet façam logs de todas as atividades de seus usuários. Todas mesmo: troca de mensagens por MSN Messenger e quetais, correio eletrônico, as páginas visitadas. O melhor de tudo é que as informações teriam de ficar disponíveis na Web. O projeto de lei se chama SAFETY: "Stopping Adults Facilitating the Exploitation of Today's Youth".

Agora, vejam vocês o que é um país em que o cidadão tem importância. Em vez de jogar o peso de se identificar no usuário, a lei proposta por Smith manda a conta para os provedores — que evidentemente a devolveriam ao consumidor, mas isso é outra questão.

21 de fevereiro de 2007, 12:22 | Comentários (2)

por falar no dahmer...

tirinha943_1_.jpg

19 de fevereiro de 2007, 10:51 | Comentários (2)

para inglês ver

Com um título que poderia ser traduzido como "quem dança seus males espanta", a Economist traça um breve retrato de como o bananão se comporta sob a mais recente onda de violência:

OSTRICH feathers and gold lamé or sequins and a tiara? Every carnival brings important sartorial choices for millions of Brazilians. But lately a new fashion accessory has found its way to the streets of Rio de Janeiro: black armbands. Waiters at a stately patisserie are wearing them. So are merrymakers at the dozens of parties thrown in the countdown to carnival. One artist did his part, painting a peace sign on the midriff of a carnival starlet. It hardly seems appropriate for a country that prides itself as the home of the world's most glittering pageant, but a brutal outbreak of violent crime has cast a pall over a city long associated with bonhomie and grace. No one is foolish enough to suggest calling off the parade but for many Cariocas, as Rio natives are called, this year's bash, which began on Friday February 16th, comes with a bitter taste.

Talvez quando 2007 começar de verdade, na quinta-feira próxima, alguém pense em fazer algo a sério quanto à violência. Enquanto isso, o Rio Body Count serve como um protesto muito mais poderoso do que moradores do Leblon vestidos de branco e artigos em blogs. A ironia é que a manifestação mais séria até agora tenha vindo de um satirista.

17 de fevereiro de 2007, 21:34 | Comentários (5)

cerca de 190 milhões de pessoas arrastam criança por 7km

O mundo real impôs uma breve pausa na redação de minha dissertação para comentar a notícia de que uma criança foi arrastada por um carro por 7 quilômetros no Rio de Janeiro. Dizem os caros colegas repórteres que três, talvez quatro bandidos foram os responsáveis. Manipulação! Estão querendo nos esconder a verdade. E a verdade é que foram 188.096.112 pessoas a arrastar a pobre criança.

São os mesmos 190 milhões de pessoas que deixam a educação chegar ao ponto de as crianças não acertarem nem 40% de uma prova de múltipla escolha. Os mesmos 190 milhões que comemoram quando a Polícia Militar humilha gente pobre, como se todos os pobres fossem bandidos. Que festejam a tomada das favelas cariocas por milícias de policiais criminosos. Que, quanto mais dinheiro têm, mais sonegam impostos. Que acham o máximo treinar artes marciais para brigar na night, as mesmas que colocam a beleza exterior à frente do desenvolvimento do espírito. As mesmas que elegem um bando de gente inútil. Os mesmos 190 milhões de pessoas que ignoram uma pergunta simples: por que os seres humanos não são intrinsecamente maus em outros lugares?

Felizmente, algumas pessoas não se deixam enganar e vão à raiz do problema. A plebe anda ameaçando os pais dos acusados, os intelectuais propõem uma eugenia pós-parto sob forma de diminuição da maioridade penal e as pessoas de bem prometem mais um protesto contra a violência. É aliviante perceber uma divisão do trabalho tão bem organizada entre os diferentes setores da sociedade para resolver as mazelas do país.

9 de fevereiro de 2007, 23:44 | Comentários (84)



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