Comentários sarcásticos, crítica vitriólica e jornalismo a golpes de martelo por Marcelo Träsel


justiça eleitoral censura manifestação política na web

Pedro Doria teve um banner de apoio a Gabeira censurado pelo Tribunal Eleitoral do Rio de Janeiro. De início, parecia ser a primeira aplicação da resolução do TSE que proíbe a propaganda política fora do site oficial do candidato -- isto é, Gabeira só poderia usar o www.gabeira.can.br ou www.gabeira.com.br ou coisa que o valha, e não perfis em redes sociais como Orkut, publicação em repositórios de vídeos como YouTube, ou microblogs como o Twitter. Porém, Pedro Doria foi censurado por fazer campanha antes do período determinado pela Justiça Eleitoral.

O caso é grave de um jeito ou de outro, até porque a causa dessa decisão do Judiciário é o mesma da resolução descrita acima: completa ignorância sobre aspectos técnicos e sociais da Internet. O próprio Doria analisou algumas facetas do problema, mas deixou de lado uma discussão sobre como se está entendendo a rede no processo eleitoral brasileiro.

Um blog como o de Pedro Doria é o equivalente à identidade de uma pessoa na Web. No mundo material temos nossos corpos, no mundo virtual temos blogs ou avatares ou perfis em redes sociais. Comum a ambos é a personalidade do indivíduo, ela é o motor dos corpos ou blogs. De modo que apoiar Gabeira com um banner no blog é o mesmo que o blogueiro defender a candidatura do deputado a prefeito do Rio numa mesa de bar, ou andar por aí com uma camiseta da campanha. Como o próprio Doria afirma, se ele tivesse pendurado na janela de casa um cartaz apoiando Gabeira, não teria sido incomodado. Um blog pessoal como o de Doria não é como um outdoor, mas sim como uma janela de casa. Através dele, capturamos alguns instantâneos da vida do autor, inclusive sua orientação política.

Isso significa que, ao proibi-lo de veicular o banner, a Justiça Eleitoral não está retirando uma propaganda indevida da Web, mas sim calando a voz de um cidadão. E a base da democracia é a possibilidade de os cidadãos expressarem sua vontade. Como não se pode fazer assembléias em um país de 180 milhões de habitantes, adotamos o sistema de voto para eleição de representantes. Cada voto representa a voz de um cidadão. Bem antes do voto, porém, há a discussão livre de idéias, a organização em partidos políticos, a deliberação, a elaboração de projetos. O voto é apenas o evento final em um longo processo de interação política de todos os setores da sociedade.

Antes, esse processo de interação social ocorria em chão de fábrica, nos bares, universidades, igrejas e outros locais de encontro da população. Hoje, esse processo se dá também na Web, através de blogs, fóruns, redes sociais, correio eletrônico, mensageiros instantâneos e outras ferramentas e serviços. O equívoco do Judiciário está em confundir o suporte em que os cidadãos veiculam suas opiniões hoje em dia com a mídia tradicional. Blogs podem até ser mídia, mas não são o mesmo tipo de mídia que jornais, revistas, televisão, ou mesmo blogs de funcionários de portais de notícias.

Se acontece de o cidadão Pedro Doria ser também jornalista, seu blog não é necessariamente um webjornal. Há blogs de médicos, advogados, contadores, taxistas. Jornalistas têm direito a uma opinião política como qualquer outro cidadão. Talvez fosse possível argumentar que Doria estivesse fazendo campanha antecipada se ele publicasse seu banner nas páginas do Estadão, onde trabalha. Porém, o banner e os textos em seu blog são apenas uma opinião, não propaganda.

30 de maio de 2008, 21:29 | Comentários (4)

autopromoção

Acompanhem amanhã, a partir das 18:00, um exemplo de como usar tecnologias da Web 2.0 para o jornalismo. Sou um dos coordenadores da Cyberfam e devo dizer que estou orgulhoso dos alunos que se propuseram a levar adiante essa empreitada. Segue o rilíze:

Maratona de 24 horas na Famecos discute uma década de jornalismo na internet

Para discutir o jornalismo praticado em uma década de internet, a Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da PUCRS realizará durante 24 horas ininterruptas o evento “10/24 – Notícia não tem hora”. As atividades ocorrerão das 18h desta quarta-feira (28/5) até as 18h de quinta-feira com um duplo objetivo: integrar a programação do + SET (série de eventos preparatórios para o 21º SET Universitário) e comemorar os 10 anos de funcionamento da Cyberfam, a pioneira das revistas eletrônicas desenvolvidas em um estágio de jornalismo online no Brasil.

Pela primeira vez no país, ocorrerá uma transmissão em alta definição (HD) via internet. Tudo que ocorrer nesta maratona poderá ser acompanhado no site http://cyberfam.pucrs.br. No site, haverá links para teleconferências, bate-papo online e apresentação de imagens captadas por câmeras instaladas na Famecos. Ainda ocorrerá transmissão de aulas do curso de Jornalismo por celular.

Para marcar os 10 anos da Cyberfam, serão entrevistados professores e alunos que já trabalharam na publicação. Um time de profissionais que atuam em Porto Alegre e em outras cidades do Brasil, dos Estados Unidos e da China foi convidado para a discussão sobre o impacto da internet no jornalismo. Os vários debates e entrevistas planejados podem ser acompanhados pelo site da Cyberfam ou por meio de televisões de plasma instaladas no saguão da Famecos (Av. Ipiranga, 6.681, prédio 7 – Porto Alegre).

Profissionais que participarão das atividades:

Alexandre Matias – O Estado de São Paulo (SP)

Ana Brambilla – Editora Abril (São Paulo)

Analú Fischer – RBS Corporação (Porto Alegre)

Fabrizzia Cinel – webdesigner

Felipe Truda – ClicRBS (Porto Alegre)

Fernanda Morena – Correio do Povo e Comitê Olímpico Chinês (China)

John Pavlik – Universidade de New Jersey (EUA)

Juliano Schüler – ClicRBS (Porto Alegre)

Luísa Berlitz – Gullane Filmes (São Paulo)

Marina Wentzel – Correspondente da BBC (China)

Michele Iracet – Zerohora.com (Porto Alegre)

Militão de Maya Ricardo – professor

Núria Saldanha – Canal Rural (São Paulo)

Priscilla Oliveira – Agência Escala (Porto Alegre)

Renata Simões – Multishow (São Paulo)

Entrevistas

Mágda Cunha – diretora da Famecos

Cristiane Finger – coordenadora do curso de Jornalismo da Famecos

Gilberto Leal – professor da Famecos

Vitor Necchi – professor da Famecos

27 de maio de 2008, 11:19 | Comentários (3)

internet e legislação

Em seu mais recente podcast, Diogo Mainardi defende que os culpados de crimes de opinião na Internet sejam responsabilizados judicialmente. Concordo. A rede mundial de computadores é um ambiente privilegiado para a expressão da opinião e de pontos de vista divergentes da média, e precisa continuar assim. Por isso mesmo, não deve se tornar -- ou continuar, se quiserem -- uma casa da mãe Joana jurídica. A impunidade só dá argumentos àqueles que são contra a liberdade de expressão.

Diogo comenta:

Digamos que um dos comentaristas anti-semitas de Caio Blinder seja professor de uma universidade pública. Como ele pode ser punido administrativamente? Só o Ministério Público tem a autoridade para pedir seu IP e tirá-lo do anonimato, identificando-o como autor do crime.

Está corretíssimo. Toda máquina que se conecta à Internet recebe um endereço IP que permite rastreá-la. Digamos que Fulano acesse um blog usando o provedor X às 15:00 do dia Y. Digamos que ele cometa calúnia, injúria ou difamação no espaço de comentários desse blog (ou fórum, ou rede social) usando o pseudônimo "Sicrano". Caso o autor do blog se sinta lesado, pode entrar na Justiça contra o comentarista. A vítima analisa os dados de "Sicrano" e passa o IP a seu advogado, além de documentar a injúria, calúnia ou difamação. O advogado então pedirá ao MP que solicite ao provedor X os dados do usuário que acessou a Internet no dia Y às 15:00 com determinado IP. O provedor, que deve guardar essa informação por cerca de dois a três meses, levanta os dados e aponta Fulano como o cliente culpado. Assim, pode-se processar fulano por calúnia, injúria ou difamação.

Infelizmente, Diogo cai na lengalenga de se criar leis específicas para a Internet:

A internet precisa de regras, de normas, de leis. E ninguém me amole dizendo que isso é coisa de estados totalitários, como a China. Nos campeonatos de futebol da Europa, quem é pego cantando coros nazistas é afastado dos estádios. A internet tem de fazer o mesmo: arrumar um jeito de desconectar seus hooligans.

A Internet não precisa de leis específicas. Injúria, calúnia e difamação continuam sendo injúria, calúnia e difamação, não importa se publicadas em um jornal impresso ou na Web. Fraude e estelionato continuam sendo fraude e estelionato, mesmo que se use e-mails e sites falsos. No máximo, necessita-se de uma ou outra regra que permitam maior rapidez no acesso aos dados de IP e um ou outro ajuste nalguma lei. O Congresso já tentou criar leis para a Internet e, obviamente, só conseguiu criar demência.

Mais importante do que criar leis e regras seria forçar uma reciclagem dos funcionários do poder Judiciário, que em geral demonstram um desconhecimento preocupante dos conceitos mais básicos relacionados à Internet e outros meios eletrônicos.

23 de maio de 2008, 14:36 | Comentários (3)

jornalista irado

À moda do Angryjournalist.com, publico o desabafo de um amigo sobre a vida na imprensa:

Fora a espécie em extinção dos repórteres-especiais, caras que podem ficar um mês fazendo uma matéria sem se meter muito com o dia-a-dia, todos os outros que demonstram alguma competência são imediatamente promovidos a cargo de chefia e são afastados da produção de conteúdo. Sistematicamente, as pessoas que produzem bom conteúdo deixam de fazê-lo; sobem hierarquicamente, em cargo mais bem pagos e supostamente de mais responsabilidade. O pior é que seus colegas passam a ser pessoas que nunca produziram nada que preste, que estão naquela pelo jogo corporativo mesmo, se dariam tão bem numa empresa de comunicação ou numa fábrica de salame.

Por que a Eliane Brum ganhou o prêmio Jabuti com um livro compilando matérias da Zero Hora, apesar de estar há quase 10 anos na Época? Porque na Época ela tem que ficar fiscalizando besteiras como o Projeto Generosidade, uma idiotice vendida para meia dúzia de anunciantes que obriga todas as revistas da casa a fazer matérias sobre ONGs durante seis meses e premia com R$ 100.000 o melhor projeto assistencial. Por que o Laurentino Gomes aproveitou o sucesso do 1808 pra cair fora da Abril? Porque lá ele tinha que ficar imaginando projetos caça-níquel para iludir patrocinadores e criar maracutaias de empurrar assinaturas goela abaixo das donas de casa.

Ou o Fabio Massari, o cara que mais entendia de música na geração dele, pedindo demissão para não ter que apresentar game show patrocinado por celular. Aí tu pega uns caras tipo Guilherme Kalil, que nunca parou em redação nenhuma e teve 'Meu Nome Não é Johnny' adaptado pro cinema. O Xico Sá, que desde que 'ó meu deus, foi demitido da Folha' só aumentou o passe e a popularidade dele. Agora não ocorrem tantos nomes, mas fora o Caco Barcellos, os autores dos melhores livros-reportagem dos últimos 15 anos não estavam empregados. São 'writers' no sentido americano da palavra, status almejado por XXXXXX XXXXX e tantos outros. Some-se a isso o fato de que os colunistas, muitas vezes pára-quedistas (sem demérito, sou contra obrigatoriedade do diploma), tipo Contardo Calligaris e Diogo Mainardi, que fazem seus veículos venderem.

E aí tu chega à conclusão de que quem quiser escrever uma grande reportagem, fazer um documentário bala, tem que sair da redação. Deixa a redação pra quem quer aumentar tiragem, audiência, produtividade, eficiência, borderô, quer bolar novas estratégias para marca, criar novos produtos editoriais. A lógica, me parece, é que as empresas se especializem na embalagem, e os frilas no conteúdo. Mas cadê bolas pra testar a teoria?

Retirei um nome próprio que poderia permitir identificar o autor da mensagem, enviada a uma lista de discussão.

3 de maio de 2008, 16:45 | Comentários (16)



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