Proteína de sapo evita demência em rato
junho 26, 2006
Estudo feito por grupo do Rio Grande do Sul aponta nova classe de medicamentos para combater o mal de Alzheimer
A bombesina, extraída de secreção do anfíbio, conteve a perda da memória nos animais; cientistas querem agora testar versão humana
Uma molécula extraída da secreção da pele de um anfíbio mostrou um caminho promissor na busca de medicamentos para combater o mal de Alzheimer. Em um experimento realizado por pesquisadores da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), a bombesina, produzida pelo sapo-de-barriga-de-fogo (Bombina bombina) conseguiu evitar em ratos a perda de memória característica da doença.
Para simular o avanço do mal de Alzheimer nos roedores, cientistas liderados pelo neurofarmacologista Rafael Roesler injetaram doses progressivas da proteína beta-amilóide nos animais. Essa molécula se acumula formando placas no tecido cerebral e acaba levando os neurônios à morte. É o mesmo processo que ocorre no mal de Alzheimer, mas no experimento a doença foi induzida artificialmente.
Ao fim do teste, elaborado pela bioquímica Tatiana Luft, os animais que tinham recebido uma dose de bombesina não passaram por processo de perda de memória acentuada.
Os cientistas pretendem agora fazer testes em pessoas, só que não exatamente com a mesma molécula. "Pretendemos, no prazo de um ano, testar clinicamente as aplicações do GRP, que é o análogo humano da bombesina", diz Roesler, que coordenou a pesquisa ao lado de Gilberto Schwartsmann.
Os dois assinam um estudo publicado neste mês pelo periódico "Neuropharmacology".
Os cientistas já sabiam que tanto a bombesina quanto a GRP atuam interagindo com a mesma proteína no corpo, a GRPR. Esta por sua vez, age como receptor, uma espécie de fechadura química na membrana das células que é acionada pela bombesina e por sua "irmã".
A escolha das substâncias surgiu da interação entre a área de especialização de Roesler e a de Schwartsmann, que é oncologista. "Vários tipos de tumor expressam grande quantidade do receptor para a bombesina, só que há estudos mostrando que eles se expressam também em alta quantidade nas membranas dos neurônios", diz Roesler. "Três anos atrás a gente começou a fazer testes com um bloqueador da ação da bombesina, e com isso conseguimos identificar que ela era importante também para processos de memória."
O caminho aberto pelo grupo de Roesler, discípulo do neurocientista gaúcho-argentino Ivan Izquierdo, tem boas chances de ganhar espaço na busca mundial por um tratamento eficaz contra o Alzheimer. O remédio usado hoje como tratamento padrão para a doença, o donepezil (nome comercial Aricept), tem se mostrado insatisfatório. A esperança nesta molécula sofreu um baque em abril do ano passado, quando um estudo da Clínica Mayo, nos EUA, mostrou que ela tinha baixa eficácia.
O donepezil "só retarda um pouco a doença no primeiro ano de tratamento, mas depois de três anos não faz diferença", diz Wagner Gattaz, professor de psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Acreditava-se que a vitamina E também pudesse ajudar a conter o avanço do Alzheimer, mas ela também acabou sendo descartada.
"Desencorajados pela falência dessas duas estratégias, os pesquisadores passaram a procurar com mais ênfase por alternativas, na qual deve se inserir a manipulação dos GRPRs", afirmou Gattaz à Folha.
Outro dado é que a pesquisa de medicamentos contra o mal de Alzheimer hoje procura compostos que possam evitar que a demência apareça. O experimento de Roesler parece ter atingido essa meta. (Folha)
Walter Valdevino Demência , Estudo Comentários (0)