Insanus
alexandre
bensimon
bituca
bruno
cardoso
carol
cisco
cove
daniel
firpo
gabriel
hermano
menezes
nova corja
parada
träsel
vanessa
Blogroll
3 vozes
alliatti
anna martha
antenor
bibs
bulcão
carine
conjunto comercial
dani
diego
g7+henrique
iuri
jousi
lima
lu
madureiras
marcia
mirella
nego
patrício
rodrigo
soares silva
solon
tams
Episódio de hoje: o dia em que levei um soco na cara de um mendigo.
Eu morava em Porto Alegre há bem poucos meses. Recém vindo do interior, ainda não tinha cultivado amizades, até porque a faculdade, meu principal mecanismo para absorção de amigos, estava em greve por tempo indeterminado.
Como eu já tinha me matriculado no inglês, passei todo o período da greve aqui mesmo, alternando longos passeios de reconhecimento do terreno com sonecas intermináveis. Mas, duas vezes por semana, tinha o tal do inglês. Terças e quintas, às 21h.
E foi fazendo o percurso até lá que tudo aconteceu.
Faltavam poucos minutos para a aula começar e eu, como sempre, andava com passo acelerado, com o pensamento a muitas léguas da esquina da São Pedro com a Benjamin, onde meu corpo e minhas apressadas pernas estavam.
Avistei um homem andando na mesma direção que eu, mas não detive nele mais de dois segundos da minha atenção. Desviei levemente a passada para não atropelá-lo e segui. Porém, quando eu estava passando rente ao indivíduo, ele se virou e desferiu-me um soco na região do zigomático direito – entre a bochecha e o olho, em termos mais vulgares.
O golpe me pegou tão desprevenido que lembro de ter pensado “o que foi isso?” ao ouvir a mão dele estalando contra minha própria face. Meu cérebro ainda não tinha sido capaz de processar que era eu a vítima do barulho.
Na fração de segundo seguinte, gritei e, completamente estupefato, reagi instintivamente: corri para o lado esquerdo, levemente conduzido pelo impacto da pancada.
Corri quase até o meio da rua, e só não o fiz totalmente porque um carro que passava pela Benjamin me coagiu com sua buzina. Comecei, então, a me deslocar pra frente, contornando uma barraca de churrasquinho que estava há uns dez passos do ocorrido. Na minha cabeça, era uma tentativa de assalto, por isso contornar a barraca me pareceu uma boa idéia para fuga.
Assim que concluí o movimento, olhei para trás, para ver a que distância de mim estava o meliante. E qual a minha surpresa ao perceber que ele estava lá, parado, no mesmo local em que havia me disparado uma bocha. Entre nós, havia agora uns quinze passos e algumas pessoas estupefatas – clientes e funcionários da banca de churrasco que buscavam com olhares desesperados entender o que estava acontecendo.
Ao perceber que o perigo estava afastado, meu cérebro despejou no meu sangue todas aquelas substâncias pós-cagaço. Agora minhas pernas estavam completamente bambas, o meu rosto latejava e ardia quente e minha mente nada conseguia processar de tudo aquilo.
Ainda assim, fui pra aula. Cheguei lá e pedi gelo na cozinha. Meus colegas mostraram um misto de espanto e vontade desesperada de rir, que eu ajudei a liberar. Não tinha porque não rir, era mesmo ridículo e muito engraçado. Fiquei toda a aula com o saco de gelo no rosto. Senti que a classe experimentou um certo alívio com aquilo tudo. Finalmente havia algo mais constrangedor na aula do que a cultura americana vista sob a ótica de um curso de inglês mórmon.
Até hoje não entendo muito bem o que levou o cara a me atingir. Minha hipótese é que passei perto demais dele que, totalmente alcoolizado, sentiu-se ameaçado. Sorte minha, aliás, que ele estava bêbado. Do contrário, o soco teria sido realmente forte, e o inchaço e as marcas poderia ter demorado bem mais tempo para desaparecer. Se bem que sóbrio ele não teria me batido. E essa dúvida que me consome até hoje sequer teria aparecido.
No próximo episódio: o dia em que subi na calçada a 12km/h e atropelei uma menina.