Como fazer tudo dar errado

A capa da Folha de São Paulo de hoje traz a manchete "Governo esvazia programa 1º Emprego".

Um ano e sete meses depois de lançar o Primeiro Emprego, o governo esvaziou a principal linha do programa. Em vez de subsidiar com R$ 1.500 empresários dispostos a contratar jovens pobres durante um ano, o Ministério do Trabalho decidiu investir na qualificação dos jovens entre 16 e 24 anos, sobretudo por meio de organizações não-governamentais.

A matéria (na íntegra aí embaixo) ilustra muito bem por que as coisas fracassam miseravelmente no Brasil.

Fica ainda mais claro que o PT assumiu o governo sem ter a mínima idéia do que fazer e, então, para preencher espaço, saiu inventando coisas mirabolantes como o Fome Zero. Agora, vendo que tudo fracassou, tira o corpo fora, quer deixar nas mãos de ONGs não mais a criação de emprego, mas a "qualificação dos jovens" - seja lá o que isso quer dizer. E agora nem interessa mais se o emprego é formal ou informal. Qualquer coisa tá valendo.

Chega a ser vergonhosa a comparação entre a meta inicial do programa (250 mil jovens) com o que efetivamente foi feito: "3.400 jovens contratados mediante incentivo do governo federal às empresas".

A idéia do programa 1º Emprego não é em si nem um pouco ruim, mas como esclarece a matéria da Folha, além dos empresários quererem gente qualificada, tudo esbarrou no PROBLEMA BRASIL:

Outro obstáculo para a ação do Primeiro Emprego são problemas das empresas com o fisco, observou o secretário: "Para receber recursos públicos, as empresas têm de estar em dia com suas obrigações, e 60% das microempresas são devedoras".

Por isso que nunca vou me arrepender de ter votado no Lula. O grande mérito do governo petista é fazer as pessoas se darem conta de que NÃO É BEM ASSIM. Não é simplesmente com EU ACHO que se faz um país funcionar. Ainda mais com o caos que impera no Brasil.

Folha de São Paulo

São Paulo, quinta-feira, 05 de maio de 2005

TRABALHO

Programa de muda foco e relega incentivos a empresas para contratação

Governo esvazia 1º Emprego para tentar capacitar jovens

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um ano e sete meses depois de lançar o Primeiro Emprego, o governo esvaziou a principal linha do programa. Em vez de subsidiar com R$ 1.500 empresários dispostos a contratar jovens pobres durante um ano, o Ministério do Trabalho decidiu investir na qualificação dos jovens entre 16 e 24 anos, sobretudo por meio de organizações não-governamentais.
A principal conseqüência da mudança é que, em vez de priorizar a criação de vagas na faixa da população que concentra 45% dos desempregados do país, o governo investe em algo de mais difícil aferição: o aumento das chances de os jovens conseguirem um emprego. A meta fixada para os cursos de qualificação é empregar entre 30% e 40% de seus alunos. Vale emprego formal e informal ou mesmo estágio.
De outubro de 2003 até agora, apenas 3.400 jovens foram contratados mediante incentivo do governo federal às empresas, na principal linha do programa, de acordo com balanço do Ministério do Trabalho.
O ministério contabiliza, ao todo, 5.300 jovens "inseridos" no mercado no período, conta que considera não apenas o emprego formal mas também outras colocações, como estágios. Quando foi lançado, o programa tinha como meta alcançar 250 mil jovens até o final do ano passado.
Um dos motivos que levaram o governo a esvaziar a principal linha do Primeiro Emprego, promessa da campanha eleitoral de Lula, foi a falta de interesse do empresariado em contratar jovens sem qualificação. "Não podemos impor ao empresariado uma solução, o mercado demanda jovem já qualificado", disse Remígio Todeschini, secretário de Políticas Públicas de Emprego, sobre as dificuldades do programa.
Outro obstáculo para a ação do Primeiro Emprego são problemas das empresas com o fisco, observou o secretário: "Para receber recursos públicos, as empresas têm de estar em dia com suas obrigações, e 60% das microempresas são devedoras".

Orçamento
O sinal mais evidente de mudança nos pilares do Primeiro Emprego aparece no Siafi (sistema de acompanhamento de gastos da União).
Pesquisa feita com apoio do gabinete do deputado distrital Augusto Carvalho (PPS) nos dados registrados até sábado mostra que, dos R$ 65 milhões destinados pelo Orçamento de 2005 ao incentivo às contratações, haviam sido pagos apenas R$ 67 mil -ou 0,1%. Já dos quase R$ 29 milhões destinados à qualificação dos jovens em situação de alto risco social para o serviço civil voluntário, R$ 1 milhão havia sido gasto.
Se considerados os chamados empenhos, que equivalem a compromissos de gastos, nota-se que a qualificação segue bem mais acelerada desde o ano passado. No Orçamento deste ano, até início de maio, são 76% de empenho para a linha da qualificação profissional, contra somente 2% para os incentivos às contratações.
Os problemas com o incentivo a empresários acompanham o Primeiro Emprego desde o seu lançamento. Em março do ano passado, a Folha localizou num restaurante em Salvador (BA) o primeiro e único jovem contratado pelo programa e beneficiado àquela altura com os repasses do ministério. Encerrado o prazo do subsídio, Renison Santos Freire foi contratado e goza atualmente seu primeiro período de férias. Recebe salário mínimo.
Logo depois de reconhecer dificuldades, o governo decidiu aumentar o valor do subsídio e afrouxar algumas regras do programa, na tentativa de atrair mais empresários. Nem assim a iniciativa deslanchou.

Consórcios
O governo também enfrentou problemas na outra linha do Primeiro Emprego, considerada agora a principal delas. Em julho do ano passado, depois de uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) e uma sindicância interna, o Ministério do Trabalho mudou as regras dos chamados Consórcios da Juventude, destinados a qualificar jovens infratores, afrodescendentes e indígenas, além de mães precoces, considerados de alto risco social.
A primeira grande experiência dos consórcios destinou R$ 7,5 milhões a um convênio do ministério com a Ágora, organização não-governamental que funciona na empresa de informática NovaData, de propriedade de Mauro Dutra, amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
No ano passado, 6.800 jovens foram qualificados pelos consórcios, e 2.050 deles teriam conseguido emprego com carteira assinada ou no mercado informal ou estágio, segundo balanço do Ministério do Trabalho. Neste ano, o ministério pretende treinar 63 mil jovens, a quem são pagas bolsas de R$ 150 durante os quatro meses do treinamento. O governo não fala mais em metas do Primeiro Emprego.
"Vamos centrar forças naquilo que está sendo bom, a qualificação dos jovens", resumiu Remígio Todeschini. "Não se joga dinheiro fora aqui", insistiu. Considerados os demais programas de qualificação profissional do governo, o secretário estima que 300 mil jovens deverão receber treinamento até o final do ano para tentar uma vaga no mercado de trabalho.

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