Tranca todo mundo dentro e toca fogo
Li a matéria inteira da Veja (aí embaixo) com a tal da denúncia contra o Maurício Marinho, chefe (agora ex, porque foi demitido) do departamento de contratação e administração de material dos Correios.
A coisa é muito mais ampla do que deu a entender na porcaria do Jornal Nacional - vergonha do jornalismo mundial.
O motivo da matéria foi um vídeo com quase 2 horas de duração no qual o senhor Marinho explica como funciona TODO o sistema de falcatrua dos cargos de confiança ocupados por indicações dos partidos da base aliado do governo, e ainda recebe uma parte da propina para incluir empresas em licitações dos Correios. No caso do Marinho, ele está ligado ao PTB e recebe ordens diretas, como ele mesmo afirmou, do presidente do partido, o deputado Roberto Jefferson.
A Veja sugere que os políticos "bem-intencionados" querem cargos de confiança para ganhar visibilidade ou mesmo servir ao país. Acho que isso não tem sentido nenhum. Pra mim, TODO MUNDO que recebe cargo de confiança por indicação partidária tá roubando.
O caso do PTB é o melhor exemplo: junto com o PL, o PTB está em segundo lugar (só depois do PT, é claro) no número de cargos de confiança no governo: 2000. A julgar pela determinação do Roberto Jefferson, pode-se facilmente dizer que TODAS essas 2000 pessoas estão fazendo falcatrua. Além do Ministério do Turismo (ministro Walfrido Mares Guia), o PTB controla a presidência da Eletronorte, a diretoria financeira da Transpetro, a diretoria de operações e logística da BR Distribuidora e a vice-presidência da Caixa Econômica Federal, entre vários outros órgãos. TODO MUNDO roubando, recebendo propina, fazendo falcatrua.
O detalhe que não poderia faltar, obviamente, é que todos esses 25 mil cargos de confiança estão diretamente sob supervisão da Casa Civil, controlada pelo José Dirceu.
Claro que todo mundo já tinha uma idéia de que isso acontecia, mas com essa matéria agora não há mais nenhuma dúvida: TODOS são ladrões, TODOS ELES.
Veja
Edição 1905 . 18 de maio de 2005
Brasil
O caso que se vai ler e ver (e ouvir em www.veja.com.br) é um microcosmo da corrupção no Brasil. Dá arrepios pensar que a mesma coisa está ocorrendo agora em milhares de outras repartições, prefeituras, câmaras municipais...
Policarpo Junior
Mauricio Marinho, diretor dos Correios, foi filmado e gravado embolsando um pacote de dinheiro dado por um corruptor
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Maurício Marinho – A gente procura agora ter muito cuidado com telefone, falar o mínimo possível. (...) Uns têm escritório, a gente vai direto no escritório. Para evitar conversa, para evitar problema.
Interlocutor 1 – É que eu achei que era o contrário. Eu achei que ia ser problema entregar aqui o dinheiro.
Maurício Marinho – Aqui é mais seguro que lá fora, aqui não tem problema.
(Nisso, um dos interlocutores saca o dinheiro e estende o maço a Maurício Marinho, enquanto outro interlocutor explica o significado desse pagamento.)
Interlocutor 2 – Eu queria trazer para você o valor inteiro...
Maurício Marinho – Entendi, entendi.
Interlocutor 2 – É só para assegurar aquela conversa que a gente tá tendo...
Maurício Marinho – Tá jóia!
Interlocutor 2 – É uma questão até de estratégia, você vai entender isso. (...) Agora fica mais simples a gente fazer o resto. Entenda isso como um sinal, um agradecimento à boa vontade.
Maurício Marinho – Não tem erro.
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Há uma cena recorrente na política nacional: são os políticos disputando, com unhas e dentes, a ocupação de cargos em todos os níveis de governo, da Esplanada dos Ministérios às câmaras municipais. Agora mesmo, uma parte do PMDB tem feito tudo para complicar a vida do Palácio do Planalto porque não conseguiu emplacar seu candidato a diretor de engenharia da Eletronorte, uma das grandes estatais elétricas do país, cujo patrimônio chega perto de 10 bilhões de reais. Por quê? Por que os políticos fazem tanta questão de ter cargos no governo? Para uns, o cargo é uma forma de ganhar visibilidade diante do eleitor e, assim, facilitar o caminho para as urnas. Para outros, é um instrumento eficaz para tirar do papel uma idéia, um projeto, uma determinada política pública. Esses são os políticos bem-intencionados. Há, porém, uma terceira categoria formada por políticos desonestos que querem cargos apenas para fazer negócios escusos – cobrar comissões, beneficiar amigos, embolsar propinas, fazer caixa dois, enriquecer ilicitamente. Quem tem intimidade com o poder em Brasília sabe que esses casos não são exceção – e em alguns bolsões de corrupção são até mesmo a regra. Raro, mesmo, é flagrar um deles em pleno vôo. Foi o que VEJA conseguiu na semana passada.
Há um mês, dois empresários estiveram no prédio central dos Correios, em Brasília. Queriam saber o que deveriam fazer para entrar no seleto grupo de empresas que fornecem equipamentos de informática à estatal. Foram à sala de Maurício Marinho, 52 anos, funcionário dos Correios há 28, que desde o fim do ano passado chefia o departamento de contratação e administração de material da empresa. Marinho foi objetivo na resposta à indagação dos empresários. Disse que, para entrar no rol de fornecedores da estatal, era preciso pagar propina. "Um acerto", na linguagem do servidor. Os empresários, sem que Marinho soubesse, filmaram a conversa. A fita, à qual VEJA teve acesso, tem 1 hora e 54 minutos de duração. É uma aula de corrupção, arrematada por uma cena lapidar: os empresários, a título de adiantamento de propina, colocam sobre a mesa um maço de 3 000 reais, Marinho pega o bolo de dinheiro, olha rapidamente e, sem conferir, coloca-o no bolso esquerdo de seu paletó. Antes e depois de embolsar os 3 000 reais de entrada, Marinho narra detalhes operacionais dos esquemas que patrocina nos Correios. Conta em que negócios é mais fácil roubar, quais os porcentuais de propina mais adequados para cada negócio e como os pagamentos podem ser feitos. "Várias formas", ensina. "Dólares, euros, tem esquema de entrega em hotéis. Se é em reais, tem gente que faz ordem de pagamento, abre conta."
Nos trechos mais relevantes da conversa, Maurício Marinho explica que está ali em nome de um partido, o PTB, e sob ordens de um político, o deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB. "Ele me dá cobertura, fala comigo, não manda recado", diz Marinho, mostrando toda sua intimidade com o cardeal petebista. "Eu não faço nada sem consultar. Tem vez que ele vem do Rio de Janeiro só para acertar um negócio. Ele é doidão." Em entrevista a VEJA, concedida através de uma ligação de celular, Marinho disse que não é filiado a nenhum partido e alegou que mal conhece Roberto Jefferson, a quem teria encontrado só duas vezes. "Uma vez no aeroporto e outra num evento, há um ano, alguma coisa do partido", disse ele. Na fita, a realidade é outra. Marinho chefia um departamento subordinado à diretoria de administração dos Correios. Desde o ano passado, o diretor de administração é Antonio Osório Batista, ex-deputado do PTB da Bahia, que chegou ao cargo por indicação de Roberto Jefferson. Na conversa gravada, Marinho conta que o diretor, um assessor e ele próprio integram um mesmo grupo e executam uma mesma missão para um mesmo patrão.
"Nós somos três e trabalhamos fechado. Os três são designados pelo PTB, pelo Roberto Jefferson", comenta o funcionário. "É uma composição com o governo. Nomeamos o diretor, um assessor e um departamento-chave. Eu sou o departamento-chave. Tudo que nós fechamos o partido fica sabendo." Será que Maurício Marinho, querendo parecer mais importante do que de fato é, começou a inventar? VEJA checou os episódios a que ele faz referência na conversa e, nos casos verificados, conclui-se que ele não tinha intenção alguma de projetar uma imagem falsa para seu interlocutor. A certa altura, ele conta que, depois de dois anos de luta, o PTB finalmente vai nomear o diretor de tecnologia dos Correios. "O novo diretor é da nossa agremiação. Quem vai cobrir a diretoria de tecnologia é o Fernando Bezerra, líder do PTB no Senado, com o apoio do Roberto Jefferson." E quem será o diretor? "O Ezequiel", diz Marinho. Na semana passada, o ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, confirmou a VEJA que o novo diretor de tecnologia será Ezequiel Ferreira de Souza. "Recebi da Casa Civil a determinação de trocar o diretor de tecnologia por uma indicação do PTB, feita pelo senador Fernando Bezerra", informou o ministro. Bingo.
Em outro trecho, Marinho fala sobre um projeto dos Correios para fornecer medicamentos mais baratos a seus funcionários. Diz que haverá uma licitação para contratar a empresa que se encarregará de comprar remédios e credenciar farmácias. "É uma brincadeirinha de 60 milhões de reais", contabiliza Marinho. Ele diz ainda que o edital foi preparado por sua turma de tal forma que as vencedoras sejam quatro empresas indicadas por políticos amigos. "Nós temos de atender às quatro que vieram indicadas pelo deputado A e pelo senador B", afirma. "Ele (refere-se ao diretor de recursos humanos, indicado pelo PMDB da Paraíba) é que vai fechar a participação. O acerto é dele. Dessa participação dele, vai uma parte para o nosso partido. A licitação vai estar saindo nos próximos dias", completou. Na semana passada, apareceu no site dos Correios o edital de convocação para empresas interessadas em participar da licitação de 60 milhões de reais. Bingo, de novo.
Quando narra o empenho no esquema do deputado Roberto Jefferson, o homem que lhe dá cobertura e não manda recado, Marinho também não parece fantasiar. VEJA ouviu um ex-freqüentador da alcova petebista, que já ocupou alto cargo federal por indicação do partido. Pedindo para não ter sua identidade revelada, ele conta que Roberto Jefferson promove reuniões periódicas com seus indicados para avaliar resultados financeiros. "Chega a ser constrangedor. Nas reuniões se fala abertamente das possibilidades de negócio, de quanto vai render e de como será feita a distribuição do dinheiro. Não há meias palavras", diz. Há casos em que são fixadas até metas. No fim do ano passado, por exemplo, o diretor de uma estatal controlada pelo PTB recebeu a visita do corretor de seguros Henrique Brandão, amigão de Roberto Jefferson. Na visita, Brandão disse ao diretor que, a partir daquela data, ele tinha de arrecadar 400 000 reais mensais para o PTB. Até ensinou como: fazer acordos com credores dispostos a pagar comissão sobre o que recebessem. Procurado por VEJA, Henrique Brandão, cujo escritório no Rio de Janeiro abriga uma peculiar coleção de 200 corujas empalhadas, confirmou que é amigo de Roberto Jefferson, mas disse que suas incursões políticas se limitam a defender os interesses dos corretores de seguros.
Fundado em 1945 pelo presidente Getúlio Vargas, o PTB de hoje não mantém nem parentesco distante com sua origem trabalhista e seu discurso nacionalista. Sufocado na ditadura militar (1964-1985), o partido só voltou ao cenário político nos anos 80 e, na década seguinte, aliou-se ao então presidente Fernando Collor, levado pelas mãos de José Carlos Martinez, morto num desastre aéreo. O deputado Roberto Jefferson, que é filiado ao PTB há mais de vinte anos, celebrizara-se pelo empenho com que integrou a tropa de choque de Collor. Desde o impeachment, o PTB participa de todos os governos, sempre beliscando um cargo aqui, outro cargo ali. Agora, no governo petista, porém, adquiriu força e vigor ímpares. Estima-se que o PTB tenha hoje cerca de 2 000 cargos de confiança no governo, mesma cifra sob controle do PL do vice-presidente José Alencar. O mais vistoso é o Ministério do Turismo, ocupado por Walfrido Mares Guia, cujo orçamento é de 1 bilhão de reais. Mas, além do ministro, o PTB tem outros cargos valiosos.
Nos escalões superiores, os petebistas ocupam mais de uma dúzia de cargos. Entre eles, há potências como a presidência da Eletronorte, ocupada pelo correligionário Roberto Salmeron. Uma das três maiores estatais elétricas do país, a Eletronorte tem mais de 5 000 funcionários e um orçamento de 940 milhões de reais. O PTB também cravou sua bandeira na gorda diretoria financeira da Transpetro, que cuida da frota que transporta o petróleo brasileiro e tem 350 milhões de dólares em investimento. O diretor financeiro da Transpetro, Álvaro Gaudêncio Neto, também faz parte da comissão que comanda a licitação para a compra de 42 petroleiros, aquisição de 1,9 bilhão de dólares. O PTB tem, ainda, a diretoria de operações e logística da BR Distribuidora, ocupada por Fernando Cunha, pela qual passam negócios de mais de 800 milhões de reais por ano. Somando-se os cargos de alto escalão, incluindo uma portentosa vice-presidência da Caixa Econômica Federal, o partido tem sob seu comando 14,5 bilhões de reais – fortuna equivalente à metade do PIB do Uruguai.
Com tanto terreno ocupado no governo petista, o PTB já protagonizou outros casos de corrupção. Em julho de 2003, seu indicado para a diretoria financeira do Departamento de Infra-estrutura de Transportes, Sérgio Pimentel, foi demitido sob a suspeita de que vinha cobrando propina para liberar pagamentos do órgão. Em setembro do ano passado, o PTB apareceu no centro de outro escândalo. VEJA noticiou que o PT comprara o apoio do PTB, pagando 150 000 reais a cada deputado. O homem da mala, que se encarregou de levar a primeira parcela do pagamento aos deputados, foi o senhor Emerson Palmieri, que já foi tesoureiro do PTB. Palmieri é personagem tarimbado em histórias esquisitas. Em 2002, quando o jornal Folha de S.Paulo revelou a existência de um caixa dois do então prefeito de Curitiba, Cassio Taniguchi, Palmieri aparecia como beneficiário de 560 000 reais. Palmieri era um dos coordenadores da campanha presidencial de Ciro Gomes, que o afastou depois do escândalo. Hoje, reabilitado pelo PT, ele é diretor de administração e finanças da Embratur, cargo que controla 165 milhões de reais. O que andará fazendo Palmieri com poder sobre tanto dinheiro público? Ninguém perde por esperar.
Na origem da praga da corrupção no governo estão os 25 000 cargos de confiança no governo federal, que são ocupados por indicação política. Estima-se que, do total, os petistas ocupem 16 000 cargos. Os outros 9 000 estão sob o controle dos partidos aliados. Se, por hipótese, 95% dos que batalharam para ocupar esses postos foram movidos por objetivos íntegros, pelo interesse de fazer política à luz do dia e executar idéias defendidas nos programas de seus partidos, ainda assim haveria 1 250 cargos nas mãos de pilantras. É uma floresta de cargos. A forma mais eficaz de evitar que esse festival de irregularidades prossiga é reduzir o número monumental de 25 000 cargos de preenchimento político – todos eles, um a um, controlados pelo chefe da Casa Civil, o ministro José Dirceu. Na Inglaterra, cada novo governo dispõe de algo em torno de 100 cargos para preencher. Na França, o número não passa de 1 000. Nos Estados Unidos, são 5 000. "A superdimensão da patronagem no Brasil gera distorções perigosas, abre a porta para a corrupção, para o nepotismo e quebra a rotina da administração, o que aumenta a ineficiência do Estado e os gastos públicos", analisa o cientista político Jairo Nicolau, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, o Iuperj.
As intenções espúrias são tão escancaradas que, nos últimos anos, até os cargos preferidos foram mudando – e sempre por razões pecuniárias. No primeiro governo tucano, por exemplo, os alvos prediletos eram estatais com farta carteira de investimentos e aquelas que seriam objeto de privatização. Atualmente, em função do rígido ajuste fiscal implementado pelo ministro Antonio Palocci, o interesse dos políticos migrou para cargos que ficam fora do alcance do contingenciamento do Orçamento. É o caso da Eletrobras, Furnas, Correios, Itaipu, Infraero, Petrobras, todas empresas com autonomia orçamentária. Antes, o Ministério dos Transportes e suas autarquias eram cobiçadíssimos pelos políticos – tanto que, nessa área, havia um feudo indomável do PMDB. Era uma época em que esses órgãos recebiam cerca de 50% do que se previa no Orçamento. Hoje, os políticos nem falam mais de órgãos nos Transportes. Examinando-se o Orçamento, descobre-se por quê: a liberação orçamentária atualmente mal passa de 10%. Entre os cargos preferidos hoje, incluem-se ainda postos nos ministérios da Saúde e da Educação. Só porque administram verbas cujo repasse é obrigatório.
Com um punhado de cargos e montanhas de dinheiro, o PTB, mesmo assim, não está satisfeito com seu quinhão no governo. No vídeo em que achaca dois empresários, Maurício Marinho diz que o esquema ainda é malfeito. "O partido é muito desorganizado", reclama. Para enfrentar as próximas eleições, ele defende que a logística da propina seja planejada com antecedência. "Nós temos de ver quantos vão ser os candidatos, o que é que vamos dar pra cada um, o que é que compete aos Correios, à Infraero, à Eletronorte, à Petrobras." Em tempo: o PTB tem apaniguados ocupando cargos em cada uma das quatro empresas citadas. Em seguida, Marinho conta seus planos de assumir, ele mesmo, uma diretoria dos Correios em abril do ano que vem, quando muitos deixarão os cargos para se candidatar nas eleições. Na semana passada, porém, quando VEJA já investigava o caso de corrupção em que se envolveu, Marinho foi afastado da chefia do departamento pelo diretor Osório Batista, o ex-líder do PTB baiano. "Ele é um profissional competente, com currículo espetacular", diz Osório Batista. Então por que foi afastado do cargo? Problemas de saúde. "Sou diabético e estou tratando do fígado", explicou Marinho. Será que o deputado Roberto Jefferson sabia disso? Procurado por VEJA, o deputado preferiu manter silêncio.
Com reportagem de Otávio Cabral e Alexandre Oltramari
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