500 anos em duas frases

ZH – As investigações devem chegar ao presidente Lula?

Severino – Sei como tudo começou, mas não sei como vai terminar. Não podemos fazer nenhuma avaliação.

"Estou preparado para qualquer cargo"

Entrevista: Severino Cavalcanti, presidente da Câmara dos Deputados
DIONE KUHN/ Enviada Especial/Brasília

Na semana que passou, o presidente da Câmara dos Deputados, o pernambucano Severino Cavalcanti (PP), provocou alvoroço em Brasília ao declarar que está preparado para assumir a Presidência da República em caso de afastamento de Luiz Inácio Lula da Silva e de seu vice, José Alencar.

Em entrevista a Zero Hora, Severino alega que a imprensa o forçou a dar essa resposta, mas reitera que se sente preparado para o cargo na eventualidade de um impeachment.

Deputado estadual por sete mandatos, Severino, 74 anos, está na Câmara desde 1995. Na avaliação que faz da crise, o parlamentar diz que acredita em Lula, mas o considera isolado.

A seguir, trechos da entrevista de 30 minutos que Severino concedeu a ZH na quinta-feira pela manhã, na residência oficial do presidente da Câmara:

Zero Hora - O senhor está mesmo preparado para assumir a Presidência da República em caso de impeachment do presidente Lula?

Severino Cavalcanti - Ora, se estou preparado para ter o desempenho que estou tendo como presidente da Câmara, estou preparado para qualquer cargo. Tenho princípios éticos e morais. A prova evidente é a minha vida pública de 40 anos. Sou um homem que tinha situação privilegiada financeiramente e hoje está bem abaixo da média dos políticos. Tinha a herança da minha mulher e era um empresário realizado. Cheguei a ter 14 lojas de eletrodomésticos. Hoje não tenho mais nada. Mas não estou arrependido, pois prestei um serviço ao país como homem público.

ZH - O senhor já tinha visto crise semelhante a esta que o país vive?

Severino - Estamos atravessando uma crise diferente das que atravessamos no país. Antes só o Poder Executivo era envolvido. Hoje, são atingidos o Executivo e o Legislativo. Precisamos dar satisfação à sociedade. Não se justifica de maneira alguma que se dê proteção àqueles que estão em débito com a sociedade. Os princípios éticos e morais são obrigatórios para todos os parlamentares e dirigentes partidários. O Brasil está esperando uma ação enérgica tanto da Câmara quanto do Executivo.

ZH - Isso significa que o senhor apóia as cassações dos deputados envolvidos no esquema de financiamento ilegal?

Severino - Tudo o que chegar ao conhecimento da presidência será investigado e enviado aos setores competentes.

ZH - O deputado José Dirceu (PT-SP) deve ser cassado?

Severino - Não recebi ainda nenhum relatório das CPIs para que eu possa afirmar se houve ou não atos de Dirceu que venham a comprometer a sua honorabilidade.

ZH - O senhor tem conversado com o presidente Lula?

Severino - Tenho, sim. Vejo que o presidente tem certa angústia em saber que foi traído por aqueles em quem mais depositava confiança. Por isso há um estado de revolta. Não vi, não senti até hoje nenhuma ação do presidente no sentido de proteger os que dilapidaram o poder público.

ZH - Já há provas suficientes para um pedido de impeachment do presidente?

Severino - Foram apresentados até o momento quatro pedidos de impeachment. Dois já mandei arquivar por falta de consistência. O terceiro vai pelo mesmo caminho. O quarto ainda vai ser analisado pela minha assessoria jurídica.

ZH - O depoimento do publicitário Duda Mendonça (que disse ter recebido dinheiro de caixa 2 no Exterior por serviços prestados ao PT, entre eles a campanha presidencial de 2002) complicou a situação do presidente?

Severino - Marcou uma nova fase das investigações. Foi o depoimento com maior consistência.

ZH - As investigações devem chegar ao presidente Lula?

Severino - Sei como tudo começou, mas não sei como vai terminar. Não podemos fazer nenhuma avaliação.

ZH - O discurso do presidente Lula dizendo que se sentiu traído convenceu a população?

Severino - Pode não ter convencido, mas mostrou a integridade do presidente. Nunca vi um presidente pedir desculpas à população por ter sido traído.

ZH - O senhor acha que o presidente foi traído?

Severino - Até agora, tenho absoluta certeza de que o presidente não sabia de nada do que estava acontecendo.

ZH - Que conselho o senhor daria para o presidente?

Severino - Diria que ele precisa ter alguém com boa postura ao lado dele, que possa levar aquele conforto necessário para um homem com a sua responsabilidade. Temos homens de valor que poderiam cercar o presidente, não o deixando viver no isolamento em que vive.

ZH - O senhor acha que o presidente está isolado?

Severino - Acho que o presidente está um pouco isolado.

ZH - O presidente, na sua opinião, deve concorrer à reeleição?

Severino - A reeleição não tem nada a ver com os atos desabonadores de alguns de seus auxiliares. A reeleição existe, e o presidente não pode ficar indiferente a ela. Será uma boa oportunidade para o povo julgar se ele cometeu algum deslize.

ZH - A sua eleição para presidente da Câmara (em fevereiro deste ano) foi surpreendente e muito criticada na época. O senhor acha que deu a volta por cima?

Severino - Eu sabia desde o início que seria eleito, tanto que na véspera da eleição comprei o terno da posse. Fui vestido com calça, camisa, gravata e cueca novas porque sabia que seria eleito. Fui o mais votado em todas as eleições que disputei para cargos da Mesa Diretora. Como corregedor, fui o que mais puniu deputados. Como 1º secretário, fiz uma economia de R$ 110 milhões, fato inédito na Câmara. Sou um presidente que dá condições de igualdade a todos os parlamentares.

ZH - O senhor se incomoda por ser chamado de rei do baixo clero?

Severino - Sei que muitas vezes a imprensa não aceita minhas colocações, mas tenho de aceitar as críticas. É até bom para poder melhorar. Sou um homem feliz. Deus me deu muitos favores. Acho que não merecia tanto.

ZH - Por que a Câmara ainda não cancelou o contrato de publicidade que tem com a SMP&B, uma vez que o seu proprietário é o empresário Marcos Valério?

Severino - Vou cancelar. Já mandei abrir nova concorrência com valores pela metade.

ZH - O senhor sabia da existência de mensalão no Congresso?

Severino - Nunca ouvi falar em ordenado ou mensalão. Podia até ter acontecido nos outros governos de algum parlamentar ter recebido alguma dádiva, mas nunca vi nem participei.

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