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A nova conta secreta de Duda

Autoridades americanas descobrem conta milionária e clandestina que o publicitário do PT mantém num banco da Flórida. Em novembro, a filha de Duda tentou sacar todo o dinheiro (Veja)

Dono de todo o país, dono do Ministro da Justiça, dono do Lula.

Veja

Edição 1938 . 11 de janeiro de 2006

Brasil

A nova conta secreta de Duda

Autoridades americanas descobrem conta milionária e clandestina que o publicitário do PT mantém num banco da Flórida. Em novembro, a filha de Duda tentou sacar todo o dinheiro

Alexandre Oltramari

O publicitário Duda Mendonça foi responsável por um dos momentos mais eletrizantes da CPI que investiga a corrupção no governo petista. Em agosto passado, num depoimento de dez horas no qual chegou a chorar, o marqueteiro responsável pela campanha presidencial de Lula confessou que seu serviço foi pago por meio de operações clandestinas no exterior. Dos 25 milhões de reais que cobrou para fazer cinco campanhas para o PT em 2002, entre elas a do presidente Lula, 10,5 milhões foram depositados em uma conta secreta nos Estados Unidos, em nome de uma empresa de fachada, a Düsseldorf. "O dinheiro era claramente de caixa dois. Nós sabíamos, mas não tínhamos outra opção. Queríamos receber", disse o publicitário, em tom de madalena arrependida, atribuindo toda a responsabilidade da operação ao lobista Marcos Valério. Duda não estava falando toda a verdade. No fim do ano passado, as autoridades americanas descobriram uma nova conta secreta e milionária operada por ele nos Estados Unidos. A conta foi bloqueada depois que a filha do publicitário, Eduarda Mendonça, foi flagrada tentando sacar todo o dinheiro. Desde então, investigações sigilosas estão sendo feitas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, para tentar rastrear a nova conta do publicitário, aberta em um banco de Miami.

A notícia sobre a existência da conta omitida por Duda chegou ao Brasil em 17 de novembro passado, por meio da promotoria de Nova York. Por telefone, o promotor Adam Kaufmann informou à Procuradoria da República a descoberta de uma outra conta do publicitário, que, assim como a Düsseldorf, foi aberta em um banco na Flórida e estava em nome de uma empresa de fachada. Por intermédio das autoridades monetárias americanas, Kaufmann, que integra um grupo que investiga lavanderias de dólares, soube que a filha do marqueteiro, a também publicitária Eduarda Mendonça, tentou resgatar todo o dinheiro disponível e fechar a conta. Eduarda só não teve sucesso porque o nome do pai consta de uma relação, chamada nos Estados Unidos de watching list, na qual estão pessoas suspeitas de lavagem de dinheiro. Duda passou a figurar na relação depois que admitiu ser dono da conta Düsseldorf, usada para receber dinheiro do PT. Desde então, todas as operações ligadas a ele nos Estados Unidos são obrigatoriamente acompanhadas. Além disso, a natureza igualmente estranha da operação tentada por Eduarda, com resgate total de fundos e encerramento da conta, levou o banco a bloquear por alguns dias o dinheiro e comunicar o fato às autoridades americanas.

A existência de outra conta clandestina de Duda no exterior é comprometedora para o marqueteiro e pode acabar respingando de novo no partido do presidente Lula. Primeiro, sugere que a estrutura de financiamento das campanhas petistas pode ter sido bem mais ampla do que se imagina. Depois, revela que o marqueteiro do presidente é reincidente na arte de ludibriar o Fisco e sonegar impostos, já que a manutenção de uma conta no exterior não declarada à Receita Federal é um crime previsto em lei que pode render até cinco anos de cadeia. E Duda sabe disso como ninguém. Logo após ter confessado o recebimento de dinheiro do valerioduto na conta da Düsseldorf, o publicitário achou que poderia ser preso. Durante uma semana, passou a acordar de madrugada e a sair de casa antes das 6 horas da manhã, horário a partir do qual a polícia pode entrar na casa de um suspeito para prendê-lo. Aconselhado por advogados, Duda pagou 4,3 milhões de reais em impostos à Receita Federal, para evitar um processo por sonegação. Ele já foi informado de que a sua segunda conta clandestina foi descoberta, mas, ao contrário da vez passada, não parece muito preocupado. Em vez de se esconder, ele comemorou tranqüilamente o réveillon na sua casa de praia em Maraú, na Bahia. Duda sabe que, apesar da ação imediata da Justiça americana, por aqui as coisas não são assim tão rápidas e ele ainda pode contar com a colaboração de alguns amigos no poder.

O promotor Adam Kaufmann advertiu os colegas brasileiros que o bloqueio do dinheiro de Duda era temporário. Para congelar os recursos com segurança, o Ministério Público deveria encaminhar um pedido formal aos Estados Unidos. Os tratados de cooperação internacional assinados entre Brasil e Estados Unidos estabelecem que isso deve ser feito pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), subordinado ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. VEJA apurou com uma fonte do DRCI, que pediu para não ser identificada, que a solicitação de bloqueio da conta de Duda foi de fato enviada aos Estados Unidos. Mas o documento foi considerado tão desprovido de consistência pelos americanos que até hoje, passados quase dois meses desde a descoberta do dinheiro, a conta ainda não foi bloqueada em definitivo. Estranhamente, o pedido não nominava nem o banco nem o número da conta. Isso, no mínimo, deu a Duda tempo suficiente para fazer o que já fizera antes com a conta Düsseldorf, que, embora tenha recebido depósitos de 10,5 milhões de reais, tinha saldo de apenas 175 dólares quando finalmente foi bloqueada por solicitação das autoridades brasileiras. Não se sabem ainda as razões que levaram o DRCI a fazer um pedido juridicamente tão desleixado.

Procurada por VEJA, a coordenadora-geral do DRCI, Wanine Santana Lima, que era procuradora da Fazenda Nacional antes de assumir a nova função, não quis comentar o caso que envolve a nova conta do publicitário. "Esse assunto é confidencial. A única coisa que eu posso dizer é que todas as informações foram repassadas às autoridades competentes e que elas se manifestaram imediatamente. Todos os pedidos foram devidamente encaminhados", diz. Em novembro passado, um relatório da Polícia Federal, divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo, acusava Wanine de atrapalhar uma missão de delegados e agentes enviados aos Estados Unidos para obter documentos sobre a conta já conhecida de Duda Mendonça. "Enquanto as equipes policiais trabalhavam nas investigações no Brasil e operacionalizavam a ida a Nova York, a representante do DRCI ,Wanine Lima, encontrava-se no exterior buscando influenciar as autoridades americanas a não repassar as informações solicitadas às autoridades de investigação constituídas e legitimadas", dizia o relatório. É uma acusação grave que agora ganha um forte ingrediente para reforçar a suspeita de que Duda conta com uma malha de proteção dentro do governo.

Desde que expôs ao país as ligações do PT com o valerioduto no exterior, Duda Mendonça se tornou um problema. Para mostrar que nada tinha a ver com as maracutaias do publicitário, o governo cancelou quase todos os contratos com a agência de Duda. Desde então, o publicitário e o governo iniciaram uma luta nos bastidores. A Petrobras, principal cliente de sua agência, chegou a anunciar que não renovaria o contrato com a agência do publicitário. O marqueteiro reagiu espalhando boatos de que estava disposto a voltar à CPI e contar o que sabia. Na noite de 10 de outubro passado, Duda Mendonça foi recebido por Lula na Granja do Torto, onde passou mais de uma hora a sós com o presidente. Foi o primeiro encontro dos dois desde o início do escândalo. Dois amigos de Duda ouvidos por VEJA disseram que Lula ofereceu ao marqueteiro, como contrapartida de uma eventual quebra de contrato com a Petrobras, campanhas eleitorais do PT em 2006. Duda disse que não faria mais campanhas políticas e exigiu a manutenção da conta da estatal. A pressão deu certo. No fim de novembro, a empresa prorrogou o contrato por mais um ano.

A nova conta secreta de Duda Mendonça, mesmo que a eventual negligência das autoridades brasileiras tenha permitido a migração do dinheiro para algum outro lugar, é uma pista importante para a polícia e o Ministério Público descobrirem a amplitude do esquema de financiamento clandestino das campanhas petistas. Se ela foi aberta antes da Düsseldorf, fica evidente que eram falsas tanto as lágrimas do publicitário como a indignação que ele tentou demonstrar ao revelar que foi coagido a abrir uma conta no exterior como única forma de receber seus honorários. Se a conta na Flórida foi aberta depois, é sinal de que ele aprovou o mecanismo, o que deixa seu depoimento mais falso ainda. Além disso, restará a suspeita de que o PT continuou abastecendo o publicitário por linhas de crédito clandestinas. O empresário e a filha serão chamados a prestar depoimento à Justiça. É possível que Duda também seja convocado a depor novamente na CPI, que tenta descobrir o destino da bolada de 337 milhões de reais que o publicitário movimentou em suas contas oficiais, no Brasil. Procurado por VEJA na semana passada, Duda Mendonça não quis falar sobre o assunto. Na sexta-feira, ele embarcou em sua lancha para uma pescaria em águas profundas do litoral da Bahia, em busca de um marlim-azul – peixe grande, cobiçado, difícil de fisgar.

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