The Mensalão Chronicles
Em homenagem ao retorno de Severino Cavalcanti ao congresso, publico aqui uma crônica de gaveta. Escrevi em julho de 2005, após um encontro rápido com o então presidente da Câmara, em Brasília, logo depois de um almoço no restaurante do qual ele cobrou propina. Severino cairia meses depois por causa do tal restaurante. Lembranças do auge da CPI do mensalão. Que dias divertidos aqueles...
O sorriso amarelo do Congresso
- E na CPI, Paiva, nós não vamos passar?
O sotaque nordestino não esconde a origem e a câmera fotográfica denuncia o caráter do passeio. A frase em tom reticente carrega uma decepção diante da qual Paiva não consegue evitar o rubor.
- Não iremos até ela porque a movimentação está muito grande - responde Paiva, com um tom de voz encabulado, como se aquela resposta não tivesse sido prevista no seu treinamento de guia turístico do Congresso Nacional.
Em seguida, imposta a voz e retoma o arranjo de falas prontas sobre os painéis e esculturas que adornam o Senado e a Câmara. O grupo de 10 pessoas aceita a resposta sem retrucar, mas encara o plenário deserto sem maior entusiasmo. Paiva tenta um consolo, com sorriso amarelo:
- O plenário está deserto justamente porque os senadores estão trabalhando na CPI e em comissões.
O grupo o segue, pouco convencido, em direção a próxima atração, passando longe da sala onde, há duas semanas, "o maior imbróglio da história do país" - para usar as palavras do empresário Marcus Valério - é o assunto dominante.
Manter uma atmosfera de normalidade em dias de tempestade é o que Paiva e as outras centenas de funcionários do Congresso tentam fazer. Mas não é fácil sorrir dentro do bunker quando as bombas não param de cair. Pior ainda no Congresso Nacional, onde o homem-bomba pode ser o próprio colega de trincheira - que o diga a senadora Heloisa Helena, a voz mais revoltada com a acusação de Roberto Jefferson, na semana passada, de que todos os seus colegas congressistas estavam afundados na lama da corrupção. É Heloisa quem mais uma vez esbraveja no telão instalado no Salão Verde do Congresso, por onde passa agora o grupo de turistas. Inevitavelmente, eles param para assistir. Paiva pede atenção novamente porque, ao lado do telão, um painel de Di Cavalcanti sobre os pioneiros de Brasília carrega uma história curiosíssima. Paiva quer contar. Quem quer saber do mensalão, afinal?
O servidor engravatado em horário de almoço, definitivamente, não quer. Recém instalado em uma das mesas do superlotado bandejão do Congresso, ele não agüenta dar a segunda garfada. Reclama do som da televisão, ligada na TV Câmara, que transmite ao vivo as discussões da CPI. Ideli Salvatti está com a palavra e exige a quebra de sigilos diversos. O servidor não se importa. Chama o garçom e reclama novamente. Recebe como resposta um sorriso amarelo - o segundo do dia - acompanhado de um argumento irrefutável: tem mais gente pedindo para aumentar do que para diminuir. Não pode fazer nada. O servidor acelera o garfo e vai embora.
Se voltasse ao Salão Verde, encontraria alguém que compartilha da sua indiferença. Distante da CPI, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, tenta organizar, com ajuda de assessores, a pequena multidão que se aglomera em busca de um autógrafo, de uma foto. O painel de Di Cavalcanti observa tudo: ao seu lado, no telão, Heloisa range os dentes; na sua frente, entediados, os turistas ouvem Paiva e, lá no fundo, a 10 metros de distância, Severino continua a viver os seus dias de glória. A fila é organizada. Severino sorri, abraça crianças, faz questão de tirar fotos com quem passar por ali.
- E você é de onde, meu filho?
- De Porto Alegre, deputado.
- Então vamos tirar uma foto!
Nesse Congresso que vive dias esquizofrênicos, que não sabe se ri ou se chora, o terceiro sorriso amarelo do dia acabou sendo o meu. Paiva encerra o passeio. Outro grupo o aguarda no saguão.
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