A demência autista do PT - 2
Segue o terceiro dia do constrangimento petista:
Sexta-feira 31/08
A estrutura é toda montada para constranger o trabalho da imprensa. O caminho só é liberado por corredores estreitos que impedem o acesso aos caciques do partido, como se qualquer curva errada fosse revelar mais algum segredo do PT. Para estabelecer uma conexão, pense em todos os Fóruns Mundiais Sociais realizados em Porto Alegre – Meca petista desde 1988, cuja queda deu-se em 2004.
Prontamente classificados como "Disneylândia da Esquerda" por setores mais conservadores da capital gaúcha, degeneraram-se através das quatro edições em escândalos financeiros, crimes no acampamento e discussões que ainda não chegaram a uma conclusão prática. No último deles, em 2005 – quando o PT já havia sido banido da prefeitura por razões que podem ser resumidas a pura miopia política –, o recado foi claro e sem ironia: quem mais defendia o evento eram os dirigentes lojistas e de hotéis.
Pois o Complexo dos Imigrantes mais parecia uma versão ainda mais distorcida do mundo de Walt Disney: o Mickey estava encastelado e não queria ser visto na Caixa Forte com o Tio Patinhas, que polia cada militant...ops, moeda às escondidas e os Irmãos Metralha tomavam conta do parque. E ai de quem perguntasse por que aquilo parecia normal.
A entrada do saguão para filiados ficava bem, mas bem longe ao acesso destinado aos jornalistas. Além das grades, um lounge com pufes e salas onde os delegados discutiriam as resoluções de cada tendência. No balcão de credenciamento, não tardo a ver um cara totalmente transtornado. Ele discutia e gesticulava contra um dos armários contratados. Não entendi chongas do que disse: algo externo o deixou daquele jeito. Seriam as vibrações negativas ou cachaça pura? Essa questão me lembrou de uma coisa essencial para agüentar o que viria.
Com um calor senegalês, a fila da cerveja – ou de outros insumos gastronômicos – estava resumida a isso: um único bar para as cerca de 2 mil pessoas lá dentro. Na fila, uma senhora vem em minha direção para dar um pacote, mas recua quando vê meu crachá:
- Ah, a imprensa não recebe o kit.
- Como assim? Eu quero.
- Ah, é que todos os outros [jornalistas] se negaram a receber.
Como constatei mais tarde, a sacola não tinha dinheiro ou qualquer tipo de toco.
De volta à entrada da "oposição", converso com quem ficou até o final do jantar de João Paulo Cunha. Naquela manhã, li que o deputado discursou contra as principais empresas de comunicação do País e que seus aliados vaiaram quem suportou ficar até o fim daquela demência. Felizmente, eu estava a caminho de casa àquela hora.
Qual não foi a minha satisfação quando o vi errar de caminho e cair na boca dos acossados da noite anterior e tentar escapar do cerco de perguntas.
Me dirijo ao cercadinho da mídia, depois de ter o caminho corrigido diversas vezes. O primeiro discurso que chama minha atenção é de Vladimir Palmeira (RJ): "Esse congresso não tem plano, mas já tem fila para a cerveja". Não podia resumir melhor.
Com frases como "Precisamos entender que o socialismo estatal fracassou" e "A gente sabe que não existe revolução no Brasil", não é de espantar que Palmeira esteja segregado pelo partido, cujos membros preferem ler sobre seu time de futebol – ou qualquer coisa sobre futebol – no jornal Lance!. Foi o discurso mais lúcido de todo o fim de semana.
A Sessão Espuma veio logo depois. "A gente tem que combater as mentiras da Globo, as mentiras da Folha", gritou Roberto Zanatini. Claro, imagino que foram elas que enfiaram os dólares na cueca do irmão de José Genoino. Temi que a horda a nos observar invadisse o curral para uma surra merecida.
Pouco depois, foi a vez do assessor para assuntos especiais do presidente Lula, Marco Aurélio Garcia. Para os de memória curta, o funcionário do governo que mandou alguém tomar no cu depois de assistir a uma reportagem no Jornal Nacional – veja a coerência – que teoricamente tirava o do governo da reta em relação à tragédia no Aeroporto de Congonhas. Foi interessante ouvir suas críticas às privatizações do governo FHC junto às dezenas de pessoas na platéia que falavam e tiravam fotos com seus celulares.
"Não há necessariamente uma crise que nos impeça de chegar ao ápice do capitalismo...quer dizer, do socialismo". O ato falho rendeu uma troca de olhares entre os repórteres. Garcia teria mesmo dito aquilo? Pode apostar. Deve estar em algum vídeo no YouTube.
Nas tendinhas armadas ao lado de fora do galpão, todo tipo de souvenires feitos por alguma tribo indígena que vive isolada do homem branco em um lugar irrelevante. Uma delas chama a minha atenção, porém: a barraca da "Construindo um Novo Brasil" me oferece de graça o livro "Em Defesa de Dirceu". É o ex-ministro quem manda naquele naco de filiados. Sem informações sobre a editora, data de impressão e afins, vi a publicação largada à própria sorte em vários boxes do banheiro masculino.
Ao fim da tarde, o senador Eduardo Suplicy (SP) mal desceu do carro e foi carregado pelas câmeras e gravadores até atender ao principal apelo: cantou "Blowin' in the Wind" por quase cinco minutos. Satisfeitos, os jornalistas se afastaram, mas isso não impediu que militantes de todas as tendências tirassem fotos e autógrafos com ele. Que Lula, que nada. O verdadeiro popstar do PT é o pai do Supla.
Sento para descansar e rever minhas anotações. Quando percebo, uma conversa amigável com uma delegada de São Paulo descamba para ofensas de parte unilateral. Dela, claro. Eu só estava parado ali. Tudo deu errado quando tentei explicar a ela que não havia o menor sentido em comparar a colisão dos dois trens em Nova Iguaçu (RJ), na quinta-feira, com o desastre do Airbus da TAM, em São Paulo.
Na concepção dela, a mídia não deu espaço e muito menos acusou o governador fluminense de assassino, como alguns fizeram com Lula, porque o trem estava "cheio de pobre". Discordei e relatei a cobertura ao vivo na TV enquanto ia para o jantar de João Paulo Cunha e todos os jornais que li.
A porca torceu o rabo quando acrescentei que até os petistas do Rio Grande do Sul admitiram que o presidente se acovardou ao reunir uma equipe no dia do acidente para avaliar as conseqüências políticas e se descolar do episódio, ao invés de tomar alguma atitude naquela noite.
Ela se levantou e gritou na minha cara: "Pois o Rio Grande do Sul tem mais é que queimar no inferno depois de eleger aquela mulher [a governadora Yeda Crusius, do PSDB]. E enquanto se retirava com sua trupe, apontou o dedo para o meu rosto e disse: "Tem outra coisa. Qual é o seu nome? Pois você é só uma pessoa e o presidente tem 60 milhões que o apóiam". Milhões do quê, ela não especificou. Eleitores – e não gado -, espero. Valeu para medir como o PT avalia a liberdade individual dos "cidadãos".
Pouco mais tarde, alguém da Juventude Petista vem perguntar onde consegui uma cerveja, mas recua quando vê minha credencial:
- Ôxe, não posso falar com você, não.
- Ué, só porque sou da Mídia Má e vou distorcer, manipular e esgarçar tudo o que tu me disser?
Faço gestos fantasmagóricos e ele relaxa. Aí, reclama que não tem ambulantes para vender coisa alguma, muito menos álcool. Digo que deveriam ter contratado um McDonald's para suprir as necessidades básicas. Ele vai embora rindo e me deixa em paz, a me preparar para a chegada dos caciques petistas.
O primeiro foi o senador Aloizio Mercadante (SP). Ele chama tanta atenção que a ministra do Turismo, Marta Suplicy, tenta aproveitar as ambulâncias instaladas oportunamente atrás de onde Mercadante estava para passar despercebida. Fazer algum trocadilho com o "Relaxa e goza" seria uma boa desculpa para não dar a mínima, mas resolvo segui-la. Ela quase conseguiu escapar. A poucos metros da entrada exclusiva, foi encurralada e teve de responder a todo tipo de pergunta.
Mas não adianta: todas as atenções estão voltadas para José Dirceu. Um dia depois de dar uma coletiva lastimável, na qual mostrou reportagem da Folha de S. Paulo para tentar desqualificar com argumentos dignos de uma criança de 10 anos a decisão do Supremo Tribunal Federal que o tornou réu – entre outras acusações – por liderar a quadrilha do mensalão.
No que adentra o pátio do complexo, ignora a presença maciça da imprensa e tenta cumprimentar os fãs. Inútil. Dezenas de pessoas – entre elas um bêbado, gente do jornal Hora do Povo que mostra o jornal para as câmeras e até a imprensa. Notei que, ao redor, petistas fazem troça do circo e mostram cara de orgulho frente à resistência do ex-guerrilheiro contra a nova ditadura.
Dali para a abertura oficial do congresso, foi um pulo. Quando vi, estava de volta ao curral jornalístico instalado nos fundos do galpão. A euforia tomou conta de quem estava no outro curral, e a demência semântica iniciou os trabalhos. Gritos de "Partido/ Partido/ É dos Trabalhadores" ecoam. Há não muitos anos, o mantra era "Partido/ Unido/ É dos trabalhadores". Mas isso foi esquecido, entre muitas outras coisas que os petistas querem ignorar.
Aliás, um aviso: nunca chame de mensalão a prática da qual a cúpula e antigo núcleo duro do governo Lula afirma que nunca existiu. Mas pode dizer que é "crise política". Repita até deixá-los felizes e vá embora sem virar as costas. Quando entra no auditório, Dirceu é ovacionado. A composição da mesa é divulgada.
Ao mencionarem que o governador do Piauí, Wellington Dias, estaria no palco, eu já sabia sobre o quê ele falaria. Isso aí: depois de enrolar muito e mencionar os avanços dos programas de energia elétrica no Estado e no "sonho" de uma senhora – beber um suco gelado -, Dias espinafrou o presidente da Phillips, Paulo Zollotto.
Chega a vez de Ricardo Berzoini, presidente da sigla, proferir suas palavras. Da primeira fileira, José Dirceu assiste, atento. O deputado fala de forma quase inocente sobre discutir o fim do poder revisor do Senado, diminuir o mandato de oito para quatro anos e tornar o Congresso Nacional unicameral. Resumindo: se uma aberração dessas for aprovada mesmo, pode entrar na fila para a castração.
O timing de Berzoini não poderia ser pior, dados os problemas que a instituição enfrenta. Quinze minutos depois, uma coordenadora do evento vem alertar os jornalistas de que "não foi bem aquilo que ele quis dizer". Tarde demais.
O estrago da noite estava feito. "Ele diz uma coisa dessas e depois nós é que somos os culpados", comenta uma repórter.
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