Em uma busca rápida na internet sobre o escritor americano Don DeLillo logo se descobre que seus livros são famosos por investigar e retratar tão bem o lado obscuro da cultura norte-americana. É mais um daqueles casos onde o mundo assustador e absurdo criado dentro de um livro acaba se tornando, num futuro próximo, um relato preciso da nossa realidade. Não é raro esse tipo de previsão dos tempos através da ficção. Os mais famosos e citados por suas obras visionárias talvez sejam George Orwell e Aldous Huxley, com 1984 e Admirável Mundo Novo.
Ruído Branco de Don DeLillo pode ser incluído nesse time. Escrito no início da década de 80, prevê a explosão da indústria farmacêutica e das pílulas que prometem alívio para as dores da alma e ao horror do vazio existencial da modernidade. Prevê também uma certa paranóia norte-americana com a contaminação tóxica e armas biológicas. A história é narrada por Jack Gladney, um professor de um curso sobre Hitler em uma pequena faculdade. Gladney se vê exposto a uma área contaminada devido a um acidente tóxico cujo gás pode ser letal. Fica obcecado com a idéia de morte que só se intensifica e o perturba. Em meio essa confusão interna, descobre que sua mulher Babbete (ótimo nome) está tomando uma pílula de nome Dylar, um remédio experimental para eliminar o medo, mais especificamente, o medo da morte. De crítico a esse tipo de medicamento, Gladney passa a querer experimentá-lo para conseguir algum alívio, mas suas tentativas para conseguir algumas pílulas o faz mergulhar em questionamentos sobre ética, compaixão, violência, em um total embaralhamento caótico de seus significados que refletem em acontecimentos em sua vida.
Na primeira parte do livro a narrativa flui muito bem, tem as melhores características: pegada e impacto do conto e lirismo de poesia. O resto do livro, particularmente a segunda parte, achei um pouco enfadonho, aquela coisa de não sair do lugar e isso não servir pra nada. O que me fez continuar lendo com prazer é que é extremamente bem escrito – e traduzido pelo Paulo Henrique Britto. No mais, os discursos que giram em torno do tema da morte são apenas caóticos e sem rumo, sem profundidade ou clarões de discernimento. Como a ironia hoje tende a contaminar todo e qualquer tipo de comunicação, pode-se pensar que todo o falatório mirabolante e aleatório sobre a morte serve apenas para mostrar o ridículo que é ser tão obcecado por ela. Se bem que não creio que essa foi a intenção do autor. Mas reconheço que essa ambigüidade só é possível dentro de um bom livro.