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Amphitryon

Incrível o livro “Amphitryon” do mexicano Ignácio Padilla. Senti o poder da literatura latino-americana que conheço muito pouco, quase nada. A trama se passa em meados da Primeira Guerra Mundial até o fim da Segunda Guerra, uma parte na Alemanha e outra Áustria. Há um motivo para um escritor mexicano tratar de um tema tão distante assim. Padilla faz parte de um movimento literário chamado Crack, que pretende dar um sai pra lá no realismo fantástico pós-Gabriel García Márquez que contaminou a literatura latina. Para dar um basta nos famigerados temas sociais entre outros recorrentes que buscam decifrar um suposto latinismo mágico.

A complexidade das situações orquestradas por Padilla faz com que tudo pareça fazer sentido apenas dentro da mente de pessoas que vivenciaram aquela época. A trama se desenrola após uma partida de xadrez em um trem que segue rumo ao front austríaco. A partida tem um trato: quem perder assume a identidade daquele que irá para guerra. Thadeus Dreyer é o vencedor e toma a identidade de Victor Kretzschmar, e passa a trabalhar como um guarda-chaves de uma estação ferroviária. O que parece ter sido uma grande sorte acaba se tornando um enorme problema capaz de lhe arrancar a alma, quando Victor reaparece como um herói da guerra.

Padilla usa as brechas da História como um campo fértil para a criação literária. A história é densa, cheia de mistérios, buracos e peças para serem encaixadas e decifradas. Requer muita energia, atenção e experiência como leitor para poder assimilar o básico disso tudo – o que, sinceramente, não é o meu caso. Não entendi muita coisa, que talvez se esclareça com uma segunda leitura; talvez não. Mesmo sendo uma leitura pesada e difícil, vale a pena. São várias as vozes do livro, os diferentes momentos históricos e suas marcas nos personagens. Apesar de ser um livro pequeno, com 171 páginas, é muito denso. A habilidade de Padilla com as palavras o faz parecer um xamã, capaz de invocar sensações desconhecidas e inexploradas. “Ampitryon” é um ótimo começo para se criar a curiosidade de conhecer mais autores dessa nova geração da literatura latino-americana, da qual Ignácio Padilla talvez seja um dos melhores.