Samjaquimsatva


 

FILTH

Depois que li Trainspotting e quase faleci lendo Pornô, quis mais Irvine Welsh. Em uma pesquisa rápida feita entre os amigos a indicação foi unânime: FILTH. Imundo, sujo, porco, obsceno, vulgar, podre, corrupto. Sendo Irvine Welsh, não foi novidade encontrar um livro repugnante e engraçado. A diferença é que em Filth o grotesco e o engraçado são levados ao extremo. É impressionante tanta barbaridade reunida em um único livro, em um único personagem, no caso o detetive Sargento Bruce Robertson.

Racista, misógino, homofóbico, psicótico e sociopata, o detetive Robertson tem o trabalho de investigar um assassinato. Várias vezes ele chega perto de descobrir o assassino, mas simplesmente não se esforça nem se interessa em ter o caso como resolvido. No meio do caminho fica muito ocupado em encher a cara, consumir drogas, forçar felação com meninas novas, abusar de prostitutas, dos amigos, das mulheres dos amigos, de absolutamente tudo e todos que se encontram ao seu redor.

É uma novela policial totalmente fora dos padrões. A trama não envolve o leitor para que ele tente decifrar como será o final, nem há respostas sobre o crime investigado. São 400 páginas de violência, sexo, abuso, ódio e deformação completa de todos os valores e sentidos humanos. Aparentemente é só isso. Mas só Irvine Welsh consegue dar legitimidade e dimensão humana ao pensamento de personagens tão grotescos e repugnantes como Bruce Robertson. Ele mostra minuciosamente o processo de crescente perturbação, sofrimento e inferno que a vida do detetive se transforma. E ele não pára nunca, faz isso com maestria até o final do livro, levando o policial a mais profunda demência e sofrimento mental possível. Aye. Deu pra ficar um bocado satisfeito de Irvine Welsh.





I Feel Pretty

O novo comercial da Nike com a Maria Sharapova tem como tema uma música onde todos cantam "I feel pretty" quando a vêem. Depois ela solta um poderoso backhand com um gritão e todos se calam. Bem sacado.





Expocom 2006

Meu livro de fotografia está classificado entre os finalistas da Expocom 2006. Pra quem não sabe do que se trata, a Expocom é uma associação que premia os melhores projetos de conclusão de curso produzidos nas faculdades de Comunicação de todo país. No ano passado foram mais de 117 faculdades e 3 mil trabalhos inscritos.

Eu nem sabia que estava concorrendo. Meu orientador que fez todo o processo de inscrever o trabalho pra mim. Só foi me avisar agora já na final. Achei bem legal. Algumas fotos do livro ficarão expostas na praça de alimentação no Campus I da PUC-Campinas durante essa semana. Em um clique dá pra ver algumas delas no Flickr.

Tomei a notícia como um incentivo para que eu não pare de tirar umas fotinhas às vezes.





Ser são

Para o psicanalista Adam Phillips, toda felicidade é sempre uma delusão, um momento de engano. Em entrevista ao The Guardian ele discute seu novo livro, Going Sane, onde analisa os problemas do idealismo emocional da busca pela felicidade. “Uma cultura obcecada pela felicidade deve estar realmente desesperada, não deve?”

Uma marca disso é a quantidade de livros de auto-ajuda que existe no mercado. O repórter chega a comentar que a cada hora chega em sua mesa um livro com a palavra “felicidade” no título. “Eles parecem ser mais parte do problema do que a solução”, diz Phillips. Sua própria editora não entendeu o recado de seu livro. Queriam usar o subtítulo “mapa da felicidade”. Ouvindo a dica, ele sugeriu “que tal mapa contra a felicidade?”

Para Phillips, a sanidade envolve aprender a apreciar conflitos, juntamente a desistir de todos os mitos de harmonia, perseverança e redenção. Pode parecer o oposto da busca pela felicidade, que muitos acreditam ser a capacidade de idealizar. Pra ele não tem mistério: a razão pela qual existem muitas pessoas deprimidas é que a vida é deprimente para muitas pessoas. A presunção da sociedade é que há uma frescura na pessoa deprimida e uma incapacidade da ciência para resolver o problema. O ideal de que “a vida é bela” é que está totalmente infundado.

É um autor que beira o auto-ajuda mas que decide ser sincero com relação ao o que é a vida. Os títulos de seus livros são interessantes. A Companhia das Letras publicou o Beijos, Cócegas e Tédio em 1996. Parece ser um autor no campo da psicanálise e ciências sociais divertido de ler. Me identifiquei com seu novo livro. Gosto de pensar que o ser humano é basicamente doente, imperfeito e incompleto. Creio que o entedimento profundo disso é a base para surgir alguma sanidade e felicidade em nossas vidas. Mas posso estar ficando maluco.





China em luto

A BBC Brasil informa que está proibido a realização de streapteases em funerais na China rural. Cancela tudo, Mojo.





Ganso Preto com Verde

O Daniel Galera fez um comentário muito legal sobre o novo livro do David Mitchell, Black Swan Green. Eu estou pra ler o Cloud Atlas, que está parado ali na estante a um tempinho. O estilo da simplicidade do Black Swan Green me deixou muito interessado.





Wallace sobre Federer

A revista de esportes PLAY do New York Times traz hoje um artigo sobre o tenista suíço nº1 do mundo Roger Federer escrito pelo David Foster Wallace. O título do artigo é “Federer as Religious Experience”.

Quem conhece DFW sabe de sua paixão pelo tênis. Ele chegou a fazer parte do ranking de tenistas juniores de seu estado. Como não alcançou o ranking nacional, foi ser um escritor genial. Metade do gigantesco Infinite Jest se passa em uma academia de tênis. Outros dois de seus artigos sobre tênis podem ser encontrados no livro A Supposedly Fun Thing I'll Never Do Again.

O texto do DFW é altamente descritivo e cheio de palavras incomuns. Só que é tão brilhante nos esforçarmos para ir até o final. No artigo da PLAY ele comenta sobre a experiência de ver o Federer ao vivo na quadra. É cheio de belas descrições do jogo e da movimentação de Federer, juntamente com as explicações do universo de possibilidades que existe nos menores detalhes no tênis. Gostei de ler um texto novo do Wallace. Acho que mesmo quem não se interessa por tênis pode gostar.

Update: A National Public Radio fez uma breve entrevista com o David Foster Wallace sobre o artigo do Federer.

Update 2: A jogada descrita no 2º parágrafo contra o Agassi no US Open 2005 começa aos 8'10'' nesse vídeo no Youtube.





Foer na Globonews

Os escritores Jonathan Safran Foer e Ali Smith estarão no programa Almanaque da Globonews na madrugada de hoje à meia-noite e meia. O tema da conversa será sobre as novas formas de expressão e narrativa na literatura, na qual ambos são considerados os principais expoentes. É a oportunidade pra quem não foi na Flip de ver os dois conversando.





Escaneando a escuridão

Boa nova no cinema. O novo filme do Richard Linklater é uma adaptação do livro “A Scanner Darkly” do Philip K Dick, o mais perturbador e famoso escritor de ficção científica. Prevejo a volta de uma adaptação de PKD para o cinema em grande estilo. “Paycheck” e “O Impostor” foram bem fraquinhos. O último legal foi “Minority Report” do Spilberg. Só pra quem não sabe “Blade Runner” também surgiu de um livro do PKD.

Não vi o filme e nem li o livro, mas parece que “A Scanner Darkly” é um retrato trágico do abuso de drogas no mundo moderno. Imagino que tanto das ilegais quanto das farmacêuticas. Quem leu o livro talvez possa dizer nos comentários. Se tratando de PKD, adicione muita paranóia, investigação sobre natureza da realidade, identidade entre outras questões existenciais. Parece também questionar a maneira como nos rebelamos contra as convenções, o que me interessa bastante. Mas parei de palpitar.

A boa notícia é que o filme todo é rotoscopado – rotoscopia é uma técnica que consiste em desenhar por cima das cenas gravadas. Linklater já usou ela no filosófico e deslumbrante “Waking Life”. O aspecto vertiginoso que fica parece perfeito para uma história do PKD. A má notícia é que Charlie Kaufman era quem estava tomando conta do roteiro, mas se desligou antes mesmo que Linklater tomasse conta do projeto.

Considero o Linklater um grande cineasta. Ele consegue fazer filmes de pessoas conversando ficarem muito agradaveis de assistir. “Antes do Amanhecer” e “Antes do Por-do-Sol” são meus ideais de filme romântico. “A Scanner Darkly” está programado pra chegar ainda esse mês no Brasil. Quero muito poder ver no cinema.

Update: O livro O Homem do Castelo Alto de Philip K Dick vai ser lançado no país no final do mês com tradução de Fábio Fernandes. Dica do Leituras do Dia.





Amor à vida, amor à morte

Ouvi falar de Georges Bataille uns quatro anos atrás. Tinha a certeza de que não queria e nem deveria lê-lo. Reconhecia a grande defasagem de experiências que impediriam a comunicação entre suas idéias e o que eu entenderia. Olhando por cima, sem compreender direito, achava apenas cru e violento demais. Na época eu estava fissurado em livros de budismo tibetano de uma inteligência revolucionária, que me parecia o oposto do pensamento de Bataille. Vendo agora, é e não é ao mesmo tempo. Ambos caminham numa busca com a mesma direção. Mês passado, Bataille me veio à mente com força, junto com a sensação de que era o momento exato que eu deveria entrar em contato com sua obra.

Li seus dois livros mais famosos, “A História do Olho” (1928) e “Eroticism” (1957). Respectivamente da Cosac Naify e Penguim Classics, já que pois a tradução do "Erotismo" é fraquinha. Se nunca tivesse ouvido falar de Bataille e se não houvesse os posfácios de Roland Barthes e Julio Cortázar, talvez eu não gostasse nem um pouco de “A História do Olho”. Reconheceria seu poder, mas não seria minha praia. A crueza do erotismo retratado nele é estampada na primeira página. E só piora. Logo de cara se repudia a linguagem, a história e o conteúdo. Mas depois de ler, você pára e percebe com desconcerto como aquilo realmente toca a fundo questões sobre o erotismo.

Entre o repudiar e o aceitar, ficamos sem entender por que os acontecimentos do livro nos perturbam e atraem tanto. Uma atração e fascínio pela repulsa total. Por que aquilo tudo que todos naturalmente rejeitam diz tanto sobre a gente? É esse aspecto de difícil compreensão que dá o caráter de obra-prima do livro. O estupro e assassinato do padre é de um surrealismo demolidor de tão violento. Algo que o diretor de cinema Gaspar Noé do filme “Irreversível” tremeria nas bases em pensar em adaptar. E ainda ouvi dizer que “Os 120 Dias de Sodoma” de Marquês de Sade é bem pior.

Na seqüência de “A História do Olho” peguei o “Eroticism”. Agora, a violência escatológica da ficção ganha a dimensão de um ensaio onde Bataille esmiuça, com uma linguagem tenta ser clara e compreensível ao máximo, os componentes que constrõem a experiência do erotismo. Em especial suas ligações com as experiências mais fortes da vida, com a morte. É atordoante a inteligência de Bataille. É muito empolgante ir lendo e reconhecendo as conexões que ele faz. Mas como? ficava sempre se queixo caído. Para dar uma idéia, alguns dos capítulos tratam a fundo questões como assassinato, guerra, sacrifício, santidade, solidão, trangressão no casamento, transgressão da orgia, prostituição, tabus, etc. Tudo para explicar o erotismo. E tudo faz sentido.

O pensamento de Bataille tem como base que o homem é essencialmente um ser solitário. Um ser de experiências descontínuas, separadas, em todos as circunstância o homem é e continuará só. Por isso, esse homem vive em busca de experiências que dão a sensação inversa, de continuidade, união, dissolução, para que ao menos por algum momento, ele se esqueça do horror de sua solidão irremediável. O interessante é como ele mostra essa movimentação interna do homem nas mais diferenças expressões externas. Pode se encontrar e criar contato com isso tanto na orgia quanto numa experiência mística religiosa. Bataille vê na quebra de tabus uma das principais vias para experimentar essa dissolução. E sempre relaciona sexo à morte (dissolução). "O sentido do erotismo é a fusão, a supressão dos limites. O sentido último do erotismo é morte".

É complicado falar sobre o livro. A inteligência de Bataille é tão vasta que cobre todos os principais aspectos da vida humana. Quando a linguagem fica bastante abstrata e complexa, dá pra perceber o quanto é grandioso o que ele está tentando transmitir. E por mais que se estude o livro, é quase impossível captar tudo. Às vezes parece que esse não entender é uma das mensagens. Se você compreender por que não consegue captar tudo, você entendeu um pouco o que ele tentou dizer.

Bataille parece ter um terceiro olho místico que vê os dois lados - ou mais - da mesma experiência. Uma frase interessante que ilustra isso é a seguinte: “A contradição do homem é que choramos diante da morte, mas quando rimos, não sabemos que estamos rindo da morte”. A linguagem de Bataille é importantíssima para o livro ser agradável e digerível. Talvez por ter sido um bibliotecário, consegue falar com propriedade sobre áreas como antropologia, sociologia e filosofia sem ter os vícios de linguagem e limitações dos acadêmicos dessas disciplinas.

Apesar das conexões nada usuais que causam estranhamento pelo livro todo, “Eroticism” é de longe o melhor livro que já li sobre as relações e o espírito humano. No fundo, há uma bondade muito grande na tentativa de Bataille tentar decifrar isso. Agora consegui entender que todo seu aspecto violento, transgressor e exagerado sempre tem como foco algo muito, mas muito amplo e bonito. De uma grandeza incomensurável que talvez possamos chamar de Deus. Ou de vida. Ou morte.





Difícil de usar

"A palavra não serve só para criar confusão. Ela serve também para esclarecer a confusão que a palavra cria."

Ferreira Gullar na Flip.





Rito e Catarse

Nia cantando "Strange Fruit" da Billie Holliday. Nia é uma menina de apenas 4 anos. Achei meigo, só no final ela se excede.





Cem melhores livros brasileiros

A Bravo! fez esse mês uma edição especial com a lista das 100 obras obrigatórias da literatura brasileira. No site da revista infelizmente não tem a lista completa, só o comentário do primeiro dela, Memórias Póstumas de Brás Cubas. Dos autores brasileiros que não li, o único que sinto que estou perdendo muito em não ler nem me interessar muito é o Nelson Rodrigues. Mas comprarei a revista certo.





Terry loves Sisley

Quem gosta do controverso trabalho do fotógrafo de moda Terry Richardson pode conferir no site oficial da Sisley as fotos que ele fez para a coleção primavera-verão 2006 da grife. A fama dele está tão grande que o próprio, cujo lugar é atrás da câmera, aparece em uma das fotos da coleção tirando a foto da modelo. O que mais gosto nas fotos do Richardson, e o que me faz não cansar de vê-las, é como ele consegue levar todas as características da fotografia amadora aos patamares mais altos do profissionalismo.





Charnel ground

Causa sensação ficar duas horas assistindo à movimentação na Unidade de Emergência Referenciada do Hospital das Clínicas da Unicamp, depois passar por uma churrascaria e ver o garçom descendo as carnes e depois passar por um barzinho lotado de pessoas que prolongaram o happy hour.





O sentido da leitura

Tiago A: "Um homem lê, lê, lê apenas para que mulheres assim olhem para ele assim."