– Mas esta história não o aborrece?– Não – disse K. – Ela me entretém.
Esse pequeno diálogo na página 100 de O Castelo resumiu pra mim muito da experiência que é ler Kafka. Talvez a própria maneira em que Kafka via sua obra, sua experiência como escritor e o reflexo que isso gera em muitos dos seus leitores. Dismistifica também a literatura como algo nobre, superior. Dá a ela um ar de ridículo. Todas as quase 500 páginas de O Castelo não lhe aborreceram? Não chega um ponto que fica chato, enfadonho? O livro pra mim não me foi uma surpresa em si, uma grande descoberta. Talvez porque desde o início, de certa forma, eu já sabia: K. não conseguirá chegar ao castelo. Ficará perdido e destruído no labirinto de complicações que dominarão sua vida. De inédito em Kafka nesse livro posso dizer que conheci bem melhor o seu senso de humor. Quanta finesse, quanta sutileza, quanto cavalherismo; é simplesmente agradabilíssimo. E o que faz parecer que literatura e Kafka sejam quase sinônimos? O que faz ele parecer ser o maior? Há milhares de análises acadêmicas em todos os campos sobre seus livros, mas prefiro ficar com a incapacidade de responder tudo isso: ela já me satisfaz. O final então, acabando do meio de uma frase, sem ponto final, sem saber o que seria a frase, sem desfecho algum, só aumenta ainda o peso da obra. A traição do amigo Max Brod de não jogar todo aquele material inacabado no lixo, que Kafka pedia em seu testamento. São muitas coisas que se fundem e dão a obra de Kafka uma aura tão única em todo o universo da literatura.