Terça-feira, 15h, desci de casa e os vizinhos já preparavam o quentão. Quase tive que lutar pelos dois últimos fardos de Polar gelada no supermercado da esquina, andando a passos largos pelo corredor pra chegar antes do senhor de camisa polo que há vinte metros vinha com o braço estendido e o olho na maçaneta. No freezer ao lado a mesma comoção acontecia pelas poucas garrafas de Coca-Cola que restavam no fundo da prateleira. Pelo menos aqui no bairro a estréia do Brasil na Copa do Mundo aqueceu a economia local. Sem exageros, a quadra inteira cheirava a pipoca.
Na rua uma horda de trabalhadores dispensados pelo turno da tarde tentava chegar a tempo de ouvir o hino e deixava em chamas o trânsito de Porto Alegre. Eu que pouco vejo, entendo ou converso sobre futebol, resolvi assistir ao jogo da seleção só pela inércia da massa. Contanto que tivesse gritaria e cerveja, a tarde não estaria totalmente perdida. Futebol aqui é feriado nacional.
Tão logo o apito, percebo que tudo não passa de uma grande farsa. Assistindo em 14 polegadas aquele time estático, tocando a bola de um lado a outro em movimentos lentos e geométricos, a única coisa que me veio à cabeça foram cenas de um jogo de futebol Gulliver. Aquele com jogadores de plástico e uma perna frouxa com alavanca pra chutar.Chuta. Mexe o jogador. Chuta de novo. Derruba um dos bonecos ao tentar tabelar. Mexe o jogador. Chuta muito forte e a bolinha sai de campo. Longe.
Um jogo parado, entediante, e impossível de prender a atenção por mais de alguns minutos. Isso pra mim foi a atuação verde amarela contra a Croácia. Até porque Futebol Club Gulliver não chegava aos pés da emoção do botão - aquela pequena tampinha verde de três camadas deslizando a mil pela lateral do campo ensebado pra fazer o gol. Isso é o que eu quero ver.
No próximo domingo recusarei convites pra assistir a partida. Vou aproveitar o vazio pra correr nu pelo meio da rua, ouvindo só de longe o zunido das cornetas. Meus dois centavos? O time não passa das oitavas.
Em tempo:
1. Mas que beleza essa camisa da Croácia, ehim?
2. Porque diabos o "dia do futebol" ainda não é feriado no Brasil?